Estava eu na maior depressão, a sofrer de desejo, de rastos como se calhar conseguem imaginar. Tenho passado as semanas a tentar afastar estas emoções de mim, até já orei, fiz simpatias, mas assim que desperto, o meu cérebro leva-me de volta para a saudade.
Decido enroscar-me no cobertor e dormir. Talvez passe o desânimo. A dor.
Nisto toca o telefone.
Atendo.
Na véspera ligaram-me no preciso momento em que também estava mergulhada no pico do sofrimento e saudade. Atendo na esperança de ser alguém que faça a diferença. Mas é uma chamada a perguntar "se estive envolvida num acidente de automóvel no qual não tenho responsabilidade".
Oh, Please!!! - exclamo em dor, e desligo a chamada.
Desato num misto de riso e choro. Riso por ter piada, choro por estar a rir e estar a sofrer.
Atendo mas não escuto nada. Desligo a chamada e voltam a ligar. Atendo. Não escuto nada novamente. Até que percebo que isso se deve ao facto de ter colocado os auscultadores. Removo-os e uma voz masculina de início imperceptível diz algumas palavras.
Ultimamente a únicas chamadas que recebo são todas relacionadas com empregos. Já nem imagino que me possam ligar por outro motivo. "Ele" não me vai ligar. Deve até ter apagado o meu número dos seus contactos. Portanto era mais um outro frete qualquer.
..."das promoções no supermercado. Estivemos a falar. Pedi-te o teu número de telefone e fiquei de te ligar".
Só uma única vez dei o número de contacto a alguém - foi ao tipo que há dois meses, mo pediu no supermercado. Já relatei a história
neste post. Ele ficou de me ligar no fim-de-semana, de tarde, para irmos jogar ténis.
Só que não o fez. Nem no fim-de-semana seguinte. Eu que estava relutante em aceitar por perceber que as suas intenções envolviam romance e até lhe confidenciei coisas privadas do foro íntimo para o fazer entender a alta improbabilidade disso vir a acontecer, não fiquei muito desapontada. Ele insistiu e quis saber: "Então se conheceres um tipo e desenvolveres sentimentos por ele, o que vais fazer?" -perguntou ele. Respondi: "Não sei. Tinha de passar por isso para saber".
Estava tão longe de sequer conjecturar essa hipótese!!!!!
E olhem agora onde estou.
É tão surpreendente que se fosse a contar a alguém (que não vou), não iam acreditar.
Falo com o Jason (assim se chama) na boa. A conversa continua a sair fluída e sincera e frontal, como eu gosto. Perguntei-lhe se se lembrava do que me perguntou. Ele lembrava-se de muita coisa da conversa e rapidamente percebeu ao que me referia.
-" Deves ser bruxo... porque... aconteceu.".
-"O quê? Já tiveste sexo com um gajo?!?".
Entre explicar que foi totalmente surpreendente, não estava nada à espera por estar convicta que jamais ia voltar a envolver-me com alguém, ele revelou que achou que fui rápida demais e não esperei por ele. (??).
Voltei a relembrá-lo: Sessenta dias... Estás a ligar, mas passados sessenta dias!". Disse-me que o desapontei porque afinal não esperei tempo algum. Voltei a relembrá-lo: Sessenta dias!. Em que não deu notícias, não mostrou interesse, deixou de aparecer no supermercado. Que não me viesse dizer que achava normal que uma pessoa que tentou engatar esperasse 60 ou mais dias pelo telefonema que devia ter feito no fim-de-semana.
Mas eu estou a cumprir a minha palavra - diz-me, engatatão. Ao que lhe faço lembrar: "A tua palavra tinha um prazo. Disses-te que telefonavas no Domingo, à tarde". - digo em voz de brincadeira.
-"Quis dar-te tempo. Percebi que estavas a colocar muitos obstáculos e que precisavas de pensar. Se eu tivesse te ligado logo, o que é que fazias? Não ias atender."
-"Ia."
-"Se eu tivesse ligado-te no Domingo, atendias?"
-"Sim".
-"E saias comigo?"
-"Sim".
-"Então e quando o Domingo chegou e eu não liguei, o que é que pensaste nos dias seguintes? Que eu deitei o teu número de telefone imediatamente no lixo?
-"Pensei que podias ligar no fim-de-semana seguinte, ou que podias ter mudado de ideias e deitado o contacto fora".
-"E se me visses no supermercado. O que fazias?"
-"Se te visse no supermercado cumprimentava-te e perguntava: "Então, e esse telefonema?".
-"Mas onde e quando conheceste esse tipo?"
-" Há coisas de cinco semanas" "No emprego".
-"Cinco semanas?!? Mas isso foi quando me conheceste!"
-"Não sei. Não ando a contar... Mas não aconteceu há cinco semanas. É recente, foi gradual... "
-"Não esperaste pelo meu telefonema! Abriste logo as pernas. Sabes qual foi o mal? Foste para a cama com o gajo errado. Devias ter ido comigo".
Ele ter-me dito que escolhi o gajo errado não me caiu muito bem. Quem se julga que é para saber? Mas deixei passar. Em honra da franqueza que logo se estipulou no primeiro contacto. A conversa estava a ser honesta e estávamos a usar termos honestos.
Ele entendeu que não sou de ir para a cama por dois tostões. Nem por um milhão. Tem de existir uma atracção e cumplicidade, caso contrário tudo me repele. O que estranhei foi ele insistir que cumpriu a palavra dele e fui eu que não fui correcta. Disse-me que nem tinha deitado fora o meu contacto, e isso provava que estava a conceder-me tempo para me habituar à ideia. (?? a sério? Acha-me burra?). Disse-me diretamente: "Eu é que era o gajo com quem tinhas de ir para a cama. Fui eu que te abri a mente para essa possibilidade e tu foste abrir as pernas a outro".
Opah...
A coisa só entrou em desacordo quando ele repetiu isto e notei que não foi com ligeireza. Disse-me que não esperei tempo algum e fui logo abrir as pernas ao primeiro que "avançou por ali a dentro". Ao que lhe respondi que eu não era assim: "Não sabes quantos gajos andam a tentar, quase diariamente..." ele corta-me a palavra, concordando, e com esta simples afirmação convenceu-me:
-"Eu sei! Eu sou um gajo".
-"Foi especial" - voltei a mencionar, sem querer entrar em descrições. Quis evidenciar que não cortei o celibato por um motivo frívolo qualquer. Mas por um sentimento que brotou onde julguei que não havia mais lugar por a terra ser árida e infértil.
E também lhe disse, já que insistia que o decepcionei por não esperar por ele (é mesmo um sedutor!), se durante esse tempo ficou trancado em casa na companhia do gato.
Ficou um pouco irritado mas eu expliquei que era uma brincadeira. O ponto de vista estava claro, parece-me.
Tive de me despedir dele e pedir para que terminássemos a conversa. Penso que já não me vai ligar. Mas fiquei contente que o tivesse feito. Mostra coragem. Ao fim de tanto tempo - e depois de não ter cumprido a palavra - é preciso tê-los no sítio para pressionar o número e ligar.
Porém também fiquei com uma ligeira impressão de "ALERTA". Então ele não liga, não aparece, não mantém o contacto, não nos relacionamos de todo, deixa que se passem mais de dois meses e cobra-me fidelidade? Essa de ter sido apanhado numa falha de palavra e querer reverter tudo para o papel de injustiçado, cuja pessoa a quem ficou de ligar não esperou por ele ao final de 60 dias... até dá para rir. Mas ele estava a falar sério nessa parte e aí senti um alarme baixinho a soar dentro de mim.
Mais uma vez reconforto-me por fazer questão de, por mais que simpatize com alguém, nunca lhe dar a conhecer onde moro.
Só existiu uma excepção. Porque ele foi inteligente, tão sereno e confiável ao passar-me o telemóvel para colocar o endereço no Google Maps... Nem me passou pela cabeça que tivesse segundas intenções. (Embora tivesse passado não digitar o endereço...).
Nesse sentido não sinto perigo vindo dele. Provavelmente nunca mais vai querer passar pela porta. Quem sabe? Não o entendo, afinal. O que sei é que estava mergulhada numa depressão sem tamanho! A questionar-me incessantemente, desde o despertar até o adormecer de exaustão e dor. Porquê!?? Que lições tenho de tirar daqui?? Pedi a todos os santos que metesse alguém realmente bom no meu caminho, merecedor.
Toca o telefone.
O inesperado telefonema do Jason não podia ter vindo em melhor altura.
Acabou por ajudar-me a afastar três semanas de uma dor dilacerante.
E fez-me pensar que tenho de tirar daqui uma lição.
Será que é Deus a querer dizer-me que existe mais peixe no mar?
Que devia lembrar-me disso??
Mas não creio que o Jason seja o "merecedor", a pessoa certa.
Também, inesperadamente, ontem de noite, ligou-me um amigo que só liga de vez em vez, quando tem uma novidade. É uma pessoa que também se deu a conhecer assim, sem amarras, de coração aberto. Não temos intimidade de contacto, mas falamos com o mesmo tipo de abertura e sinceridade como se fossemos amigos íntimos. Já somos amigos "de há muito tempo" - vai por volta de 12 anos. Mas não do género "vou à tua casa, tu à minha" contudo, convidou-me a aparecer por lá ao saber que ia viajar para Portugal. E sei que estava a ser sincero. Isso agrada-me.
E isto é OUTRO SINAL.
Que tenho de aprender a ler.
Existe quem goste de nós mas não está presente todos os dias.
Este amigo tem o dom de me fazer sentir bem sem se esforçar, só por ser como é e mantermos uma conversa normal. E também ele ligou inesperadamente, num momento de profunda depressão e desespero.
Já é a segunda vez que me faz isto, sem sequer suspeitar.
Deve ser a providência.
Quanto ao Jason, o seu telefonema acabou por fazer-me um bem imenso.
Estava a ser disputada, ahah!
Passados mais de 60 dias do que imagino terem sido outras investidas frustradas, achou que ainda encontrava aqui a "sobresselente" para provar. Ai, ai... Fez-me gargalhar de espanto.
Senti-me de imediato melhor.
Espero que a sensação dure.
PS: Se o Jason ligou passados 60 dias com interesse por mim, quem sabe ele não ligue também?
Mas aí já estou a alimentar esperanças. Não quero fazer isso.
Gostei do Jason mas obviamente não me envolvi com ele, nem com ninguém que tivesse mostrado interesse nisso entre ele e "ele". Ter convivido diariamente com "ele" e tê-lo visto transformar-se em algo que me agradou dia para dia foi o que fez com que desenvolvesse sentimentos. Prestativo, atencioso, acanhado, insinuador e algo hesitante... pronto a agradar. Mas também volátil. Por vezes frio. Precisava ir lá aquecê-lo até vê-lo sorrir. Isto fez com que fosse possível nascer sentimentos especiais. Não. Não vou alimentar esperanças. Não posso. É idiota da minha parte.