terça-feira, 23 de março de 2010

Síndrome de Alta Classe

A primeira vez que percebi estar diante de uma pessoa destas, o adjectivo surgiu-me nos lábios sem dificuldade. PEDANTE. Uma palavra tão simples, fora do meu dicionário desde que a aprendi, lá nos confins da infância. E no entanto, lá estava ela, surgida do nada e PERFEITA para adjectivar a pessoa que estava à minha frente.
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A sensação com que se fica equivale à necessidade de ir tomar banho. Pelo menos é assim que hoje percebi, quando, no final do dia, após uma troca de ideias sobre o que são as "boas maneiras" e já esquecida do assunto, do nada, este vem à lembrança. São estes os instantes em que as ideias ficam cristalinas, como uma revelação.
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Tenho uma amiga de infância que foi criada no seio de uma família com dinheiro. Factor que tenta minimizar, mas que traz sempre à baila. Diz ela que consegue detectar uma pessoa com boa formação só por observar os modos que tem à mesa e que certas coisas a incomodam bastante, chegando a sentir nojo dessa pessoa. Ora, dizer isto após observar uma amiga a levar um pedaço de bolo à boca com a ponta da faca não abona muito a seu favor, porque não é capaz de se conter e faz logo uma reprimenda. No decorrer do "debate" sobre boas-maneiras, falámos de outras ocasiões em que ela não deixou de fazer observações sobre a "falta de educação" de outros. Eu defendo que, num ambiente descontraído e na sociedade actual, muita coisa não pode ser conotada como sendo falta de educação. É apenas uma forma diferente de agir e, a meu ver, tem lógica e faz sentido. Colocar os braços na berma da mesa, por exemplo. É algo que se vê por todo o lado. Porquê se há de manter este gesto simples e inocente na categoria da "falta de educação", especialmente estando nós num ambiente descontraído, num café de esplanada? Na vida de correria que temos hoje-em-dia, muitas coisas deixaram de ter essa conotação pois não seria justo para com o quotidiano e as pessoas.
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"Falta de educação" são outras coisas. E não tem nada a ver com "berço". Embora entenda o que quis dizer quando empregou o termo "nível", distinguindo as pessoas dessa classe como sendo novos-ricos e ricos com tradição, discordo que é preciso receber "essa" educação para se endender o que significa. Entendo, mas não estou de acordo com algo que me parece incorrecto. Porque, nisto de "catalogar" as pessoas com mais ou menos etiqueta, o acto em si é já uma grande falta de educação. Não concordam? Assim como é fazer uma observação imediata e em voz alta. Se fosse eu a querer chamar a atenção de alguém para um comportamento menos adequado à mesa, fazê-lo-ia de forma discreta. Quando estivessemos a sós ou no momento, se necessário fosse, mas discretamente, numa pausa, ou pedia licença e iamos as duas à casa-de-banho (toillete, pronto!) "retocar" a maquilhagem :). Mas nunca dispararia assim, a seco, como a violência de um tiro: "Isso é falta de educação".
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Eis algumas frases que já a ouvi dizer:
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"Deve-se usar a faca e o garfo à mesa, isso é falta de educação"
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"Não se põe a mala em cima da mesa, é falta de educação"
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"Não se lê à mesa, é falta de educação"
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"Não se põe o guardanapo assim, é falta de educação"
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"Usas-te o guardanapo para limpar a boca e agora o nariz, isso é falta de educação"
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Ora... falta de educação não é também fazer estes reparos? Ainda mais porque muitos são injustos e, a maioria das vezes, perpectuados pela própria que os critica, segundos antes...
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É um estranho comportamento, que só agora no meu "momento de clareza" entendi que se prende com sensação de inferioridade para com uma realidade de dualidades. Ao mesmo tempo que se quer passar por pessoa humilde e simples, dentro dela existe a educação "do dinheiro", que a faz conhecer o "patamar superior" e, assim, um pouco petulante, lá do alto do castelo, olha para os vassalos que lavram a terra, lá em baixo... é um complexo. Que muitos têm. Conheço algumas pessoas que não conseguem parar de referir as suas origens "abastadas". Mas a maioria, quando as conheço um pouco melhor, revelam-se pessoas desagradáveis, que, pela aparência e tão somente por isso, DISCRIMINAM as outras. Se é isto o resultado de uma educação esmerada, facultada por se ter nascido no seio de uma família rica, então... fico contente com a minha, que tantos problemas me deu!
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Não resisto em partilhar aqui uma situação que observei. Num restaurante, uma amiga nossa que não ia almoçar e por isso estava sentada na mesa anexa que não tinha toalha de papel posta, estava a arrumar o jornal matutino que desejava ler desde que o comprara nessa manhã cedo, mas, por achar que não era o local nem a altura apropriada, começou a arrumá-lo. Aí sente um puxão e percebe que o mesmo lhe foi tirado das mãos, pela colega que, depois, irá dizer que é falta de educação ler à mesa! Claro que, primeiro leu o jornal, só depois, quando chegou o prato de comida, é que o pôs de lado e se saiu com esta, que, sinceramente, não entendi. No final, sentada na cadeira de lado, com as costas em contacto com a parede e após petiscar do prato alheio e encher-se de comida como uma burra, pega no pacotinho de açucar e dobra-o várias vezes para palitar os dentes.
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Falta de educação... é caso para dizer: diz o roto ao nu!
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Mas, convenhamos... não existe aqui um problema qualquer de pedantismo? Uma espécie de sindrome de "alta classe"? Que triste! A boa educação é algo que se define com simplicidade. Ou é a própria simplicidade em si. Existe outra sim, a formal, a cerimonial, a que se usa quando se vai jantar com o presidente da República, por exemplo! Mas são outros contextos que nada têm a ver com a pessoa ser ou não dotada de boa educação. O povo português, na sua maioria é simples e com raízes no campo, onde os costumes são, por si só, também simples e acolhedores. É até uma ofensa defender que o "bem receber" português das pessoas humildes é falta de educação, quando são um afago tão agradável ao coração! Que não morra o hábito com aqueles que nasceram em tempos que cada vez ficam mais para trás...

Empregos em Portugal - a situação lamentável

Tenho andado a analisar o mercado de trabalho dentro do contexto da sociedade portuguesa actual e o optimismo foi pela janela. Aliás, sinto-me deprimida e muito, mas muito desapontada e triste. O absurdo impera nas chamadas "ofertas" de trabalho. Não são precárias, são uma ofensa! E depois sai nas notícias que o Centro de Emprego tem "não sei quantas" ofertas que ninguém aceita. Como se os portugueses não quisessem trabalhar! Ora, senhores jornalistas, por acaso foram analisar essas ofertas antes de "paparem" o press release com as estatísticas? Deixem-me então dizer-lhes que são, sem dúvida alguma, umas grandes merdas.
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Em suma, querem trabalhadores que cumpram horários e funções de escravo, a troco de um salário de alforro... (ex-escravo). As ofertas consistem em trabalhos full-time com possibilidades de trabalho fora de horas e fins-de-semana, em que a tarefa é fazer 101 coisas, deixando porpositadamente de fora a informação de que ainda se tem de fazer a limpeza ao espaço, fechar a loja e fazer as contas da caixa, e tratar da logística e receber fornecedores, e tratar de papelada, e repor o stock nas prateleiras... tudo isto numa simples função de "empregada de balcão de loja". E a troco do quê como salário? O mínimo!!! Nem 500€ oferecem para este tipo de Full-times com horas extra não remuneradas.
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Depois vêm os estágios. Em catapulta, ofertas massivas, exigem, a troco de NADA, trabalhadores em regime full-time, altamente qualificados, que devem submeterem-se a condições sem quaisquer atractivos para trabalhar muito, sem ganhar nada em troca. Na área do audiovisual em particular, tenho visto uma determinada empresa sediada perto do jardim da Gulbenkian a solicitar estagiários para todo o tipo de funções (jornalistas, editores, etc), full time, oferecendo "subsídio de alimentação e deslocação" (um grande nome para dizer uns 100€/mês) faz já 4 (QUATRO!!) anos. De quatro em quatro meses, lá estão as "ofertas"... que generosidade! E colocarem alguém nos quadros, não apetece?? É muito tempo a sobreviver à custa de estagiários! E aposto que uns ganham muito, para outros não terem nada! Existem entidades para supervisionar isto ou não??
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Depois querem que Portugal vá para a frente. Pois não irá. Assim, não. Começa-se a "cultivar" a ideia de que um bom trabalhador faz horas extraordinárias todos os dias e não deve sequer esperar ser remunerado por isso. No meu emprego (que por hora tenho) ganho metade do salário dos restantes. Trabalho 3 vezes mais, recebo menos reconhecimento pelo trabalho que efectuo, sou menos apreciada por não andar ali a lembrar o chefe e os colegas o quanto "sou boa". Durante meses, uns encostaram-se na poltrona e deixaram o trabalho passar ao lado. Estive eu a aguentar a pontas, a levar o barco a bom-porto, fazendo imensas horas de trabalho, sem ganhar mais um tostão por isso. Aliás, o mês passado trabalhei, efectivamente (sem pausas para lanche ou momentos lentos) 200 horas! Para quem é trabalhador por conta própria a cumprir horário fixo numa empresa há já ANO E MEIO, isto é um absurdo. E sabem que mais? Alguns colegas torcem o nariz ao me verem trabalhar dentro de um horário normal. Agridem-me por isso! Mesmo trabalhando menos. Querem ser aqueles que podem astear a bandeira "Eu faço mais horas que tu!", ainda que, num horário de 8 horas, 2 delas passem a olhar pela janela, uma a passear, três a complicar as tarefas mais simples e uma a ir beber cafezinhos.
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Ora... eu sei trabalhar bem e fazer o meu trabalho de forma produtiva dentro do horário das 8h diárias. Não preciso fazer horas extra! E isto devia entrar de uma vez por todas dentro das cabecinhas dos nossos superiores. Fazer horas não faz avançar. Caso contrário, nestes quase 2 anos em que tenho trabalhado neste sistema, teriamos visto frutos e não se estaria à mercê da bancarrota. A falta de bons gestores e bons profissionais, isso sim, é que é uma calamidade!!
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E é isto que eu não aceito. Isto está errado. Portugal e qualquer país desenvolvido não vai para a frente se as pessoas trabalharem o dia todo e regressarem a casa só para dormir. Isso não nos traz prosperidade! Vejam só o caso da China, uma república comunista, que implementou o trabalho de escravatura após a 2ª Guerra Mundial. É o país com a maior taxa de desemprego que existe! E lá, faz muitos anos, que a exploração é uma situação quotidiana e os trabalhadores assalariados são explorados e trabalham até 20 horas por dia!!! Foram longe? Não!!! E se alguns acham que a China é uma super-potência económica, vejam lá se percebem que foi à custa do sangue dos oprimidos. Sim, porque os trabalhadores explorados e com privação de sono, a fazer directas atrás de directas, sofriam muitos acidentes de trabalho e simplesmente eram dispensados quando ficavam sem membros como braços, mãos ou pernas, ou os químicos lhes tirou a saúde e o bom funcionamento dos órgãos internos. Existe muito sangue e vidas pisadas nos alicerces da China... é este o trilho que Portugal quer seguir? Parece!!!
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Se a China fosse boa, Portugal não estaria cheia de Chineses que, em carros de luxo, se deslocam até 15ª loja de "3oo" (300$ = 1.50€), cujos preços estão longe, bem longe de ser baratos (já nada custa menos de 3€ e tudo é de qualidade reduzida e com alta probabilidade de ser fruto do comércio injusto). O governo Chinês PAGA para que os seus se alastrem que nem cancro para outros países e vendam os seus produtos, conquistando mercados e ANIQUILANDO os de acolhimento, com toda a injustiça e atitude criminosa que é abrir as portas à expansão do comércio injusto (aquele em que, em toda a cadeia de produção, uns ganham o dinheiro todo, outros trabalham de graça, aumentado a distância entre poucos ricos e muitos pobres). E assim, as famílias chinesas em Portugal e noutros países, usufruem de um estilo de vida que lhes teria sido impossível sonhar no país de origem e, depressa, aprenderam que podem ficar mais ricos ainda... aumentando os preços para os praticados no panorama português (com produtos de outra qualidade). Sabem que uma peça qualquer, seja para que propósito for, na China, o CUSTO é tão irrisório para o comerciante, que uma certa quantidade chega a ser de graça?? Um documentário na TV mostrou-me um porta-chaves multi-funções, com luz, som etc, a custo de... 0.20 cêntimos! Para ser vendido em lojas "caras" ou "baratas" entre 5€ a 50€ euros!
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Portanto, não se iludam. A economia como está é uma bosta. E se não nos tornarmos individualistas, acho que não nos safamos. Portugal está uma miséria. As ofertas de trabalho são uma ofensa à sobrevivência de qualquer indivíduo. Uma renda de casa não é inferior a 500€, mas um salário é! Que vergonha!!! Por isso é que aumentam os estrangeiros que vivem em situações ainda piores que nós (miséria) no país de origem. É para este tipo de trabalhador que se está a abrir as portas: o que trabalha por qualquer miséria. E vejo-os todos os dias. Partilham os transportes públicos comigo. Muitos da europa de leste, outros, nem sei de onde são, mas que lá têm os seus turbantes na cabeça, têm. Todos a cheirar mal, com sinais de pouca higiene... que vergonha, Portugal. Que vergonha!!
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Porém, se olharmos pela janela, vemos as nossas estradas movimentadas, cheias de automóveis. Pensamos que isso é progresso e sinal de poder económico... a gasolina é tão cara, os empregos uma miséria, onde ir buscar dinheiro?
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Eu sou uma pessoa bem formada. Agora imagino aqueles que não têm formação alguma e que, moralmente, têm padrões mais baixos. Se a uma pessoa com as minhas qualificações é oferecido uma posição de ordenado mínimo, os que oferecem 200€ por mês em FULL TIME, ou 400€ - porque vi MUITAS ofertas deste tipo em portais de emprego, vão contentar-se com isto sem resistir á tentação do crime? É que roubar ou ficar em casa a receber o subsídio parece ser mais rentável! Além de todos os males que esta situação precária e injusta de diferença salarial traz, ainda gera crime! Portugal, acorda!! Muda de rumo... eu estou muito desiludida...
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Que tristeza!

quinta-feira, 11 de março de 2010

Bullying na escola - morte no rio

O suicídio do menino de 12 anos no rio Tua devido ao bulling sofrido na escola tem muito que se lhe diga. Leando, que era o seu nome, devia ser o rosto icónico deste "cancro" nojento que se espalha por todo o lado na sociedade. O bulling que o vitimou, existe por toda a parte. E não são só as crianças que o sofrem ou o fazem. Infelismente, se alguém disesse a Leandro que, ao crescer, ao abandonar a escola e ao se tornar adulto, as coisas iam ser diferentes, estaria a mentir. O menino não aguentou. Não viu motivos para continuar a viver assim. Num impulso que é compreensível de entender dadas as circunstâncias, foi directo ao rio e escolheu a horrível morte por afogamento.


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Que não passe em vão. Que obrigue à reflexão, há mudança de comportamentos. Todos aqueles - crianças e adultos, que maltratam terceiros, deviam sentir que contribuiram para este desfexo. Quem se relacciona com os outros usando palavras que funcionam como punhais, e gestos "inocentes" que, na realidade são agressões, deve sentir-se muito mal com a morte deste menino. Porque, se estivessem lá, se fossem os colegas de escola de Leandro, seriam aqueles que o agrediram, não seria diferente. Portanto, VERGONHA! Vergonha a todos que praticam bulling! Criaturas infelizes, de mau carácter, que não têm a nobreza e a pureza de alma daqueles que, como Leandro, não tinham em si para ripostar.

Triste sociedade que, de tantas mudanças em prol da liberdade e respeito pelas diferenças, tornou-se permissiva. Jovens e crianças sem uma boa horientação educacional e adultos responsáveis e em posições de responsabilidade, que viram a cabeça para o lado, sem entender que crime é crime, não importa se é ou não cada vez mais comum...
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Esses colegas de escola de Leandro deviam ser chamados à atenção e carregar o caixão do menino até à campa, ainda que simbólicamente, ainda que não se encontre o seu corpo, para nunca mais esquecerem que as nossas acções têm consequências.

terça-feira, 9 de março de 2010

Quem vê caras... tem de ver algo mais!

Quando andava na universidade fiz um trabalho sobre vítimas de agressões e mencionei que, num determinado ano, um homem foi vítima de violação. Este dado foi recolhido da imprensa, que, por sua vez, mencionou que a sua fonte foi a APAV. A reacção de quem o leu, inclusive a da docente, foi de espanto e um tanto de descrédito.

Não sei porquê o menciono aqui... Talvez porque vim falar de vítimas, nomeadamente, das escolhidas pelo "violador de Telheiras". Acabei por ler artigos escritos online sobre o assunto e este é um tópico que se espalha em tantas direcções...
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A primeira vez que tive "contacto" com esta história foi quando vi o retrato robot no jornal, há não mais de duas semanas. Já tarde... tudo o resto, passou-me ao lado: o relato dos seus actos, a denúncia das vítimas... Mirei aquela imagem minúscula demoradamente. Quis procurar naquele desenho a ameaça que normalmente se sente no olhar. Algo muitas vezes possível de identificar quando vemos imagens reais, uma fotografia ou um trecho de vídeo, e já sabemos estar a olhar para os olhos de um assassino e violador.


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Não encontrei nada ameaçador. E isso deixou-me alerta. Tratando-se de um desenho, talvez o que procurava não fosse possível achar mas, agora que este agressor foi positivamente identificado e a sua fotografia divulgada, sei que, tal como no desenho, a sua aparência não transmite nada de preocupante.


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Talvez por isso tenho verificado que algumas pessoas procuram entender o que pode levar tal indivíduo a agir como agiu. Algumas até, parecem "defendê-lo" ao se preocuparem com o destino da figura na cadeia. E tudo isto porque, sejamos francos, este criminoso TEM boa aparência. Aparentemente tem também muitos e bons amigos e, até o momento da sua apreenção, era visto pelos colegas com bons olhos. Nada, no perfil deste criminoso, suscitaria maiores preocupações se, algures nesta descrição, algo fosse menos "perfeito". Uma aparência mais estranha talvez, um relato duvidoso a respeito da sua personalidade, uma indumentária duvidosa... nada disto está presente.
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O que se sabe é que, este homem, de 30 anos, confessou ter violado ao menos 40 jovens raparigas, muitas, senão todas, menores de 18 anos. Isto diz-me que se trata de um indivíduo que sente necessidade de dar a conhecer a terceiros os seus feitos. Claramente, trata-se de uma pessoa com tendência compulsiva para este crime. Cometeu 40 e continuará a cometer violações até o resto da vida. Digo isto após reflectir sobre o assunto porque, de início, também fiz "parte" daqueles que se preocuparam com o contributo da cadeia na formação deste seu lado da dupla personalidade.
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A regeneração é algo em que queremos acreditar mas, na realidade, não é algo muito realista. As estatísticas não mentem. Os violadores saem da cadeia para a liberdade e retomam os seus crimes. Os assassinos também. Esta é uma verdade. Se a cadeia os deve regenerar, é outra questão. O papel primordial é proteger a sociedade, isolando o indivíduo e deixando as restantes pessoas sentirem-se mais seguras. É uma necessidade válida e justa.
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A regeneração também é muito utilizada pelos criminosos mais inteligentes, como ferramenta para enganar a sociedade. Alguns convencem os melhores peritos, apenas para perpectuar os seus crimes por mais anos, quase sem serem detectados. Quer dizer... só ouvimos falar daqueles que são porque, aqueles que não são, esses, nunca sabemos. A cadeia faculta cursos de formação aos reclusos, cujo direito e validade não discuto. Porém, não acredito na total regeneração de um indivíduo que, por exemplo, consegue erguer uma faca e repetidamente ferir mortalmente outro ser humano. Não acredito que um pedófilo alguma vez perca a vontade de ter relações sexuais com uma criança. Talvez acredite que, para toda a vida, tenham de viver sobre controlo. Mas de quem, bem... mais de si próprios que de terceiros. Só que, sozinhos, não chegam lá. É como pedir a uma mãe a cujo filho foi cometido males terríveis ou mesmo tirado a vida, para deixar de viver com o trauma... este não desaparece. O impulso criminoso também não.
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Não sei qual é a linha que separa as nossas boas acções das más, mas fico contente por não padecer dessa perturbação. Graças a Deus, a maioria de nós não desata a cometer crimes sem mais nem menos... mas seja qual for essa linha, o indivíduo que a atravessou uma vez, atravessa duas e três. Não tem como ser diferente, porque já cometeu esse acto de diferença. É uma pessoa diferente. Deve ser tratado como tal. É uma ameaça à integridade e à vida das outras pessoas. Deve-se ter em conta.

Com isto quero reforçar que uma pessoa tem de estar sempre atenta. Talvez aqueles que rodeavam este violador, às tantas, suspeitassem de algo... é o que sempre pensamos. Mas não podemos pensar assim, porque assim muitas vezes não é. O importante é estar sempre e na medida do possível, alerta. Ficar atento a tudo o que nos foi ensinado há muitos anos, quando, em crianças, os adultos nos disseram como agir perante a abordagem de desconhecidos. O "seguro morreu de velho" e "quem vê caras não vê corações". Duas expressões populares que carregam total veracidade nas suas palavras...

domingo, 7 de março de 2010

Pessoas do Campo V Pessoas da Cidade

O ser humano acredita demasiado em expressões populares, em ideias pré-concebidas e em conceitos generalistas. Num destes dias, deparei-me com uma situação destas e mais ou menos que me obriguei a pensar bem no assunto e a tirar as minhas próprias conclusões.

O tópico de debate foi: "Campo e Cidade: As pessoas que vivem na cidade não sabem o que é uma vaca, nunca viram uma galinha etc, etc..."
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Esta foi a ideia pré-concebida com que me deparei. Decidi pensar a sério no assunto. Afinal, esta "noção" de que as pessoas nascidas e criadas em cidades grandes, como Lisboa, não sabem o que é um animal, tem fundamento? E o contrário, as pessoas que vivem em locais menos desenvolvidos e mais campestres, sabem o que é uma galinha?



Para entender melhor este conceito, fui analizar-me a mim mesma. Citadina de gema, nascida e criada em Lisboa, num bairro não muito tradicional e bem desenvolvido, perto do aeroporto, perto de centros comerciais, cinemas, parques infantis, auto-estradas, rio Tejo, quartéis militares... enfim: sou a personificação citadina perfeita para testar esta "definição" de que, na cidade, somos uns "perdidos", uns ignorantes sobre o verdadeiro aspecto dos animais que nos chega ao prato como alimento.
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Olhei então para dentro em busca da resposta. Não sei o que é um coelho? Uma vaca? Um cavalo? Uma ovelha? Uma galinha? Um pato? Vamos lá ver...
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Não podia concordar. Sei perfeitamente o que é cada animal, conheço-os. E não é somente pela televisão, pelos livros, pelo ensino na escola. Sei o que são mesmo quando, no supermercado, não passam de pedaços de carne com etiquetas. Sei o que é o fígado de porco, o que é uma determinada parte da vaca... então, porque acham que não posso saber?
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Depois olhei para o lado dos "não citadinos". Afinal, que contacto têm com tais animais? Descobri que muito pouco ou quase nenhum. Não passam, para alguns, de memórias de infância, de experiências antigas e esporádicas que os marcaram, pela pouca frequência com que aconteceram.



Perante tal descoberta, é justo continuar a alimentar essa noção de que, na CIDADE não se sabe o que é um animal domesticado? Claro que não!
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Meses antes, este mesmo grupo recebeu bilhetes para o jardim Zoológico de Lisboa. Pela forma de conversarem, percebi que os "do campo" estavam bem mais entusiasmados com a possibilidade de voltar a ver os elefantes, e, principalmente, os golfinhos... os citadinos, nomeadamente os de Lisboa, como têm quase sempre tudo tão disponível, não se entusiasmaram tanto.
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Chego então à conclusão que, os da cidade só perdem para o agricultor. Para aqueles que ainda vivem mesmo da terra e lidam com criação de animais. O resto é folclore.


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OS ANIMAIS E NÓS

Nem sei quando comecei a perceber o que são animais do campo, porque nunca senti que me faltava perceber fosse o que fosse. Na escola primária, aprendi tudo o que havia para saber sobre a diversidade do reino animal, da fauna e da flora... não se pode desmerecer o papel do ensino nesta parte. Até porque a maioria da literatura destinada às crianças visando o seu desenvolvimento psíquico e motor envolve a compreensão inicial do Pato, do Gato, da Quinta, do Porco, etc... de onde vem o leite? Da vaca! De onde vêm os ovos? Da galinha! Portanto, não vamos deitar por terra o precioso contributo dos primeiros anos de vida de uma criança.
No meu caso, sempre vi animais e nunca precisei sair da cidade para isso. Sempre surgem "aqui e ali". Lisboa não é uma metrópole de costas viradas para a natureza. Sempre vivi em zonas com muitos jardins, alguns dos quais com diversos animais. Patos, gansos, galinhas, aves de toda a espécie, pavões, coelhos, peixes... o jardim da Estrela, o jardim do Campo Grande continuam onde sempre estiveram, disponível a todos os que os queiram visitar. No meu tempo, faziam-se piqueniques nestes locais... ainda hoje, dividir o espaço com pavões enquanto aguardo na paragem de transportes a chegada do autocarro não é nada de surpreender quando no Campo Grande. Aqueles que estranham a presença destas aves, são os não citadinos...
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Sou citadina e só por isso não sei o que é um animal do campo? Vão-se lixar! Devo ter mais contacto com animais do que alguns a viver em localidades pequenas. Ainda a semana passada levei a filhota às aulas de equitação, onde ela e as amigas vão criando laços entre si e os animais. Há uns meses fiquei a tomar conta de outra criança, muito irrequieta e levei-a à quinta pedagógica, onde, além de estar ao ar livre, pode interagir com os animais: correu atrás das ovelhas que estavam a ser recolhidas para o estábulo, viu como comem, deu pão às cabras, deu festas ao burro... tudo isto é válido e permite uma interacção que prova que os laços entre o campo e a cidade nunca foram cortados. Quando era criança, não foi só numa das muitas Praças (mercados) de Lisboa que tive contacto com o comércio de animais do campo para consumo humano. Também existiam quintas, que a população, na maioria com origens no campo, mantinha perto de casa, para se sentirem ligados à terra. Vi os coelhos, dei-lhes de comer, pedi para que não fossem mortos para o nosso almoço...
Hoje em dia, a minha vida continua povoada de animais. Passo todos os dias por rebanhos e manadas, mais que não seja pela estrada. Na rua que tenho de atravessar, alguns moradores mantêm animais do campo, como galo, galinhas, cabras, ovelhas e patos. Todos os dias oiço-os a cacarejar ou a balir... mas o que mais escuto, é o ladrar! Porque os cães, não os comemos, mas também são animais e ali fazem guarda, latindo à passagem de cada peão.
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Para mim ficou provado que esta noção de que na cidade as pessoas não sabem o que são animais do campo, é totalmente descabida. Não só conhecemos estes, como aqueles que facilmente podemos encontrar no Zoológico e no circo. As pessoas da cidade nunca viraram as costas às suas ancestrais ligações com o campo. E a cidade também não esquece a importância da natureza e da diversidade na vida das pessoas.