Voltei a ser aluna na escola.
A primeira sensação ao pisar novamente o interior de uma Universidade foi normalíssima. Até me movimentar dentro de todos aqueles pisos e salas pela primeira vez foi feito sem erro e com naturalidade, como se já conhecesse todo o espaço. Integrei-me e mesclei-me com os outros, como se ali andasse sempre e tudo me fosse familiar.
Ocorreu-me que a diferença de idade entre mim e a grande maioria dos outros estudantes pudesse ser incomodamente notória. Afinal, faz 15 anos que me licenciei. No entanto depois de lá entrar depressa isso não se tornou uma questão. Tirando uns poucos moiços e moiçolas com ar imberbe e com jeito assustado, os restantes pareciam tão comuns e ninguém se pôs a olhar fixamente para mim. Também não esperava tal exagero, claro! Mas a verdade é que não existiram nem dedos a apontar nem olhares fixados ou alguém adotou aquele ar: «o que é que esta cota está a fazer aqui?» LOL ;)
Quais são as diferenças que senti, perguntam vocês, desta segunda vez?
Bom, para começar e com um sentimento de lástima e desistência de minha parte, quando me solicitaram o número de ALUNA e fui consultar o papel que acabara de receber, constato que também aqui sou referida com a designação CLIENTE. Isso meio que esmaga a «ilusão», a ideia de que estou num antro de aprendizagem e é ela o propósito tanto do estudante quanto da entidade formadora.
Relembrei o quanto temos de saltar de fila em fila, aguardar longos minutos, só para tratar de coisas burocráticas. Fiquei horas por lá. A principal diferença contudo está no recurso das novas tecnologias. Já não é preciso transportar fotocópias ou fotografias tipo-passe, tudo está digitalizado e informatizado. Os processos são imediatos. A propina foi imediatamente paga por multibanco. Uma quantia considerável, que julguei ser impossível realizar de uma vez só, mas equivoquei-me. A fotografia é tirada no momento, no local, através de uma webcam. A minha saiu um tanto feia e com péssima qualidade mas quero me convencer de que isso que nunca teve importância antes não terá agora que estou muito mais velha (agora é que começa a ter, claro!). Todo este processo culmina com a abertura de uma conta no banco. Já me havia esquecido que as Universidades são uma fonte, um elixir irresistível para umas tantas empresas e negociantes, que querem aliciar os jovens adultos a se vincularem aos seus produtos. Foi-me oferecido um cartão de telemóvel com não-sei-o-quê de promoção, fui informada de que teria desconto numa escola de condução quando fosse tirar a carta, etc, etc, etc. Nada me aliciou na realidade. Mas agradeci e abri conta, deixando um não-tão-simbólico depósito, porque alternativa não existia, pelo que pude perceber. Se 100.000 alunos ingressaram naquela faculdade este ano, 100.000 novas contas (ou quase) foi o que aquele banco conseguiu «agarrar». Agora multipliquem isto por todas as universidades deste país e imaginem, imaginem só o que um aluno representa para um Banco. Aqui a designação CLIENTE realmente aplica-se.
Mas sabem o que realmente se diferenciou aos meus olhos? A quantidade de jovens (e menos jovens) a se inscreverem num MESTRADO. Fico a pensar para quê todo aquele conhecimento, será que será um investimento com retorno? Vão alongar os anos de estudo e valerá a pena? Irão as portas se abrir para todos estes «mestres» ou poderá acontecer, após tantos anos de esforço e dedicação, irem parar a um trabalho básico qualquer, como um call center, a receber uma miséria que dispensava todo aquele investimento?
Enquanto aguardava vez numa das muitas filas para burocracias (apresentadas com simpatia e sorrisos) olhava para fora, para a multidão de alunos espalhados pelo pátio. Olhando para a diversidade me interroguei qual deles teria sido eu, há uns anos atrás. Certamente não era a rapariga muito jovem, sentada num grupo, com ar tímido de quem não abria a boca para dizer nada e nem está confortável ou integrada. É próximo do que posso ter sido, mas não tanto. O olhar depois saltou para o casal à minha frente. Não, seguramente não seria eu nenhum daqueles ali. Dois indivíduos com ar desajeitado e pouco desejado, ele semi-careca, ela baixa e nada atraente, mal vestidos, que se beijavam de forma desajeitada e abusada, como se andassem às «experiências», nas «curtes». Às tantas a falta de jeito dá lugar a um outro beijo mais longo e intensificado e desvio o olhar porque a coisa está a ficar repelente. Ainda vejo a rapariga se levantar e sentar no colo do rapaz que momentos antes parecia querer devora-la tão somente por esta permitir um avanço. O "casal" de pombinhos com ar pouco romântico depressa se separa sem parecer existir sequer trocas de olhares afectuosos.
Também não seria eu uma daquele grupo de raparigas trajadas. Não, jamais. Jamais ia gastar uma fortuna, ainda por cima dinheiro de meus pais, para ter uma roupa absurdamente cara que não é realmente necessária ou pode ser usada noutras ocasiões, somente para me sentir melhor ou dentro de uma «classe» diferenciada. E entre todos estes observados reparei ainda nos "loners", rapazes que estavam sozinhos e eram aparentemente mais velhos. Coincidência?
Creio que vai ser óptimo para mim voltar a integrar os bancos da escola. Queira-se ou não, é uma atmosfera diferente. Ali estão pessoas empenhadas, decididas a seguir um percurso, a lutar por boas notas e bons conhecimentos. Pessoas que sabem falar e desenvolver opiniões sobre vários temas, em princípio pessoas educadas e respeitadoras, que sabem se expressar usando uma linguagem mais erudita. Estou a precisar disto. De estar rodeada de outras perspectivas e de gente bem formada. É muito diferente daquela que tem sido a realidade dos últimos anos.
Vou empenhar-me muito neste regresso aos bancos da escola. Vou estudar bastante, frequentar a biblioteca, usar os recursos que tiver ao meus dispor e acreditar em mim. É com outra segurança e outra perspectiva em mente que volto a ser uma ALUNA UNIVERSITÁRIA.