Foi preciso ler um livro de mistério e homicídio faz apenas dois anos, para descobrir que sempre sofri de ansiedade social. Não sabia. Nem sabia que sofria, nem sabia que existia um termo para isso. Mas quando li a descrição fez-se luz. Referia-se, no livro, á pessoa mais "popular", mais dada, aquela que tinha fama de falar sem parar, e de ajudar todos. Fez-me perceber que cumprimentar as pessoas, sorrir, falar, etc - não elimina a ansiedade social.
Que mais tenho para descobrir sobre a minha pessoa?
Sempre soube que sou mais tímida e introvertida que outra coisa. Mas talvez não dissessem isso de mim quem me conhece em situações sociais, pois falo com as pessoas e gosto de as conhecer. Quem me conhece desde sempre, deste criança, sabe que sou introvertida. Guardo tudo para dentro - principalmente o sofrimento. Porém, sinto-me intimidada antes de conhecer alguém e depois. Pode até mesmo causar estranheza. No dia seguinte, se tiver de passar por essa pessoa, sinto-o.
Mas não é sobre esta condição que vim falar. É sobre uma outra. Para a qual ainda não tenho definição. Mas pelo que li na internet, em inglês denomina-se Sensoring Overloading. "Sobre-exposição sensorial" - será essa a tradução?
Há coisas que me irritam ligeiramente e delas tento fugir por instinto - sem disso dar conta. Vou dar exemplos de agora mesmo, quando fui a correr ao consultório médico. A certa altura no meu caminho cruza uma rapariga mais à frente, que vem a fumar. Eu corro para a ultrapassar. Não quero respirar o fumo dela. Incomoda-me o fumo dos cigarros. Incomoda-me mesmo. E como estou com o nariz bloqueado, a sensação de fadiga, não posso com cheiros fortes, que me enjoam ou desencadeiam tosse.
No autocarro, quando saio do emprego às 7 da manhã, entra sempre um homem incorporado, que se senta ou atrás ou à frente do assento onde me sento. O cheiro a cigarro que emana das roupas dele é demais. Não aguento. É extraordinário como me incomoda. Sempre tive o hábito de prender a respiração perante odores desagradáveis. Pelo que respiro o menos possível. Tapo o nariz com o casaco... mas nada faz desaparecer aquele forte e desagradável cheiro. Quero muito sair para o ar livre, é só o que me apetece fazer. Mal posso esperar. É só uma paragem - o homem entra numa e eu saio na seguinte. Mas parece uma eternidade. Se calhar o senhor até é boa pessoa - mas quando o vejo entrar - acho que não consigo disfarçar uma cara de desgosto.
É que, quando acabo o trabalho - quero muito silêncio, sossego e tranquilidade. Até mesmo no trabalho - na pausa - tenho o hábito de me isolar a um canto sem ruídos. É o que me apraz. Foi herculana as tentativas de encontrar tal local. Cada vez que me sentava num canto - vinha alguém e dizia que não podia estar ali. Ou aparecia gente a falar alto e a comer comida indiana, com um cheiro que não se pode de caril e outras especiarias. Outro odor que não entra bem comigo. Cheiros intensos a óleo, gordura, fritos... são naturais enquanto se cozinha. Mas depois de dias, ainda permanecerem... não posso.
Sinto-me agredida pelos sentidos. Anseio por ar puro - mas sempre fui assim. Sempre gostei do ar, do vento, do cheiro da relva molhada, do cheiro a árvores, flores, maresia... De sons, só mesmo os da natureza.
Cada vez mais o som também incomoda. Sair da paragem do autocarro e caminhar até o emprego - é irritante durante o percurso pela estrada. Os carros estão sempre a passar e o ruído das rodas no asfalto é demais. Corto caminho por uma estrada menos conhecida e quase sempre caminho-a toda sem a presença de um único carro. Quando se dá excepções e, subitamente, passam dois, três, quatro.. estraga-me a experiência. Libertam os fumos de escape e é a primeira coisa que me entra pelos sentidos. Estragam tudo, é desagradável. O caminho é arborizado pelo lado esquerdo. Sem automóveis a passar, sente-se o aroma, aqui e ali, a oxigénio, a natureza. Passa uma viatura... e os meus pulmões estão a receber químicos em forma de fumo. Uma coisa que nunca gostei de ver são carros parados com o motor a funcionar. O ruído que fazem - principalmente quando estacionados numa via não movimentada - parece um atentado. Não suporto o ruído dos motores dos veículos. Alguns, que se escutam a léguas de distância, para mim são um acto criminoso. Os décibeis daquilo deviam ser proibidos e quem os conduz devia ser preso.
Por vezes tapo os ouvidos por já não aguentar ruído. No emprego não tenho escolha. Trabalho perto de máquinas, há ruído por toda a parte. Mal nos conseguimos escutar uns aos outros. É talvez por isso ainda mais essencial para mim que vá descansar num local sem ruídos. Não gosto de ir para a cantina - está toda a gente na conversa, outros estão a ver programas no telemóvel com o som alto, outros ligam a TV... e eu, a única coisa que quero escutar é... nada. Quietude. Paz.
Finalmente, durante a pandemia - encontrei o meu cantinho secreto. Vou para o último piso - agora abandonado, e sento-me no chão, no safe heaven (local seguro em caso de incêndio), mesmo ao lado de uma tomada. Ligo o telemóvel, que fica a carregar e tenho uma vista fantástica pela janela paronâmica - que nunca vejo porque é noite serrada. Mas de dia, vêm-se uns montes e as vacas a pastar. É este tipo de cenário que preciso depois de abandonar os Pi-piiii, oha,oha,oha, pocks, Zets, tacks, Íà, ìà, tock-tock, clash! - os sons no local de trabalho.
Mas não é só isto...
Não gosto de sair aos fins-de-semana, porque onde quer que vá, tudo está cheio de gente. Adoro trabalhar aos Domingos e se tiver um livre, acabo descontente se o usar para tentar comprar algo. Acho os centros comerciais locais a evitar a TODO O CUSTO. Supermercados a mesma coisa. Parques. Prefiro ficar em casa. Na realidade, prefiro ir trabalhar e ter o meu dia livre durante a semana - quando a maioria da "manada" de pessoas tem os seus afazeres e deveres.
OK.. o que vinha dizer era isto, que me aconteceu faz coisa de uma hora mas que acontece muito - e me deixa chateada. Não muito, mas um tanto. ODEIO que me cruzem à frente e me façam abrandar. Tenho um passo acelerado. Quando vocês vêm uma pessoa de passo acelerado a andar em linha reta, cruzam-se com ela na diagonal e passam-lhe na frente, em passo brando? É que acontece comigo amiúde. E eu não gosto. A pessoa que se atravessa à minha frente e abranda o passo, obriga-me a abrandar o meu - e nesse instante sinto um incómodo na base da coluna que não sinto se continuar ao meu passo acelerado.Hoje, saia do médico, a apertar o casaco ao peito com uma mão, tentando bloquear o máximo possível o ataque do vento - pois estou com princípios de uma constipação que passou muito ao tomar hoje cedo um medicamento. Porém, exposta assim ao frio e vento - ia piorar de certeza. Já estava a sentir os pulmões frágeis. Acelerei o passo para chegar a casa e voltar para a cama - de onde me despertaram 3h30m depois de nela ter adormecido.
Vem o homem, surge da minha direita, mete-se na minha frente e tem um passo mais lento. Eu até travo, reduzo a velocidade (e sinto aquele incómodo lombar). Mas depois penso: Porquê tenho de parar de andar à minha velocidade normal? Ele é que se cruzou comigo. Ele é que está a atravessar o meu caminho na diagonal. Eu estava no passeio a seguir direito, ele cruza vindo da estrada à direita, rumo a outra rua mais à frente, no meu lado esquerdo. Retomo o meu ritmo e nisto o meu sapato toca no dele, no instante em que ele fica na minha esquerda e eu continuo em frente. Nisto, comigo já a atravessar a estrada e ele já na rua que desejava ir - diz-me algo do género: "E um pedido de desculpa, não? Se fosse foder..."
Mas pede-se desculpa por toques na rua? Coisas de raspão? Não. Acontece. Seja como for, ele é que devia me pedir desculpa por me cortar o andamento e cruzar-se à minha frente. É o equivalente a conduzir um carro a alta velocidade e um peão atravessar-se na frente, tendo de fazer uma travagem brusca para evitar a colisão. Ora essa! As regras no passeio deviam ser idênticas. Ele vinha com o telemóvel na mão, colocou-se à minha frente intencionalmente, vendo-me a andar depressa. Tive de abrandar subitamente - para não colidir com o obstáculo.
Como ele disse a palavra "F" eu respondi "You too pal. Fuck You".
Um exagero, de parte a parte. Sem necessidade. Mas pronto.
Aqui acontece muito me irritar com circunstâncias de circulação no passeio. Noutro dia, caminhava no passeio, mesmo à berma. Há minha frente vinha um grupo de rapazes - a ocupar o passeio inteiro. Ora, dita as normas com as quais cresci que, um deles, teria de se desviar. Não podem ocupar o passeio inteiro e esperar que a outra pessoa é que se desvie! Eu já estava na berma... não tinha mais para onde ir. Nem me preocupei - dita as regras sociais que um deles se encolhia - porque eu já tinha me desviado o máximo que podia. Pois os rapazes passam, não fazem qualquer esforço para deixarem o caminho aberto à passagem de um peão no sentido contrário. O rapaz mais próximo de mim dá-me um encontrão no braço e continua a caminhar, sem pronunciar o tal "pedido de desculpa" que os britânicos gostam de exigir. Este é o género de coisa que, de forma crescente, começa a ser mais intolerável para mim. A falta de educação... não deixar espaço para as pessoas circularem nos passeios, nos supermercados... é demais. Até mesmo quando estou no passeio do lado da relva enlameada e existe um espaço tremendo para se passar, há quem tenha vindo contra mim, continuando a caminhar contra mim e eu é que tenho de parar o passo, literalmente, para alguém que vem na diagonal, da minha esquerda para a minha direita, passar. Enquanto segura um copo de café... Depois ainda faz um som de escárnio e eu fico a pensar se estou errada... porque eu não podia me desviar mais! Só se fosse para a lama. E aquela pessoa, além de espaço, tinha tempo. Podia ter-me deixado passar e passar depois. Mas não... vê uma pessoa a caminhar a passo rápido - quase em corrida - e põe-se na frente, ainda fica chateada por a pessoa não se desviar, pisando na lama - o único espaço disponível porque os amiguinhos dela estavam a caminhar no outro lado. Querem o espaço todo para eles aqui no UK. Não os entendo. Foram educados com outros conceitos que não os meus.
Quis partilhar defeitos. Não somos sempre correctos e tenho esta imperfeição - que é cada vez mais notória para mim: sofro de "road rage" só que no passeio. "pedestrian rage"?
É algo novo, ainda não bem definido. É algo do qual se começa a falar.
Não estou num nível grave - não desato aos berros, aos ataques, não sou violenta. Apenas me desagrada bastante este género de situações e por dentro, deixa-me irritada, estraga-me o momento. Dou outro exemplo: pessoas no supermercado que ficam paradas e bloqueiam o espaço para circular. Acontece muito aqui no UK e juro - não entendo. Não entendo como não se colocam de lado para permitir o fluxo de pessoas. Apenas se agrupam ao centro e enquanto ali ficam - ninguém passa.
Faz-me lembrar episódios dos Simpsons, em que, na escola, o miudo tótó é chefe de corredor - e cabe a ele dizer aos colegas para "circular, circular" e "abrir espaço". Os adultos precisam de um monitor de corredor de supermercado, em uniforme, que se chegue perto e lhes diga: encoste-se à esquerda, permita o fluxo de clientes à sua direita. A noção de que se trata de uma postura rude não lhes é conhecida. Não percebem o egoísmo e descaso com os demais. Se passares apressadamente por entre eles, a rude és tu. Devias pedir licença... mesmo com licença, por vezes não retiram os carrinhos do meio do caminho.
Enfim... eu estou cada vez menos civilizada para os "com licença, desculpe" - eu que sempre os esbanjei!