terça-feira, 23 de outubro de 2018

Despedida da praia.. com limpeza de areal


Deus sabe que não morro de amores por pombos. Mas não foi por isso que deixei de sentir alguma apreensão. 

Estava a passear na margem da praia, impressionada pela quantidade de gaivotas paradas no areal. Pareciam hipnotizadas a olhar no horizonte o lençol de água. O que aguardavam? Porquê se punham em tão grande número deitadas no areal, o olhar o mar, sem se mexerem? Por instantes uma sensação de temor veio ao de cima e percebi qual a inspiração de Alfred Hitchcock para o seu filme "Os pássaros". Aquelas aves pareciam ameaçadoras, misteriosas. 


Enquanto me perdia nestes pensamentos artísticos e despedia-me do verão (ainda que já no outono), dizendo "adeus, até para o ano" ao mar português, observei entre as marcas deixadas pela orla das ondas uns detritos brancos, em grande quantidade. Pequenos, mas numerosos. O que seriam? Aproximei-me para observar.

Sim, era lixo. Mas que lixo?
ESFEROVITE.

Centenas, milhares de pedaços de diferentes dimensões, depositados no areal, enquanto mesmo ao lado aves bicavam detritos, ingerindo-os. A mais próxima era um pombo. Pus-me a imaginar os efeitos que o esferovite ia ter no estômago do pombo. Provavelmente inchava até entupir-lhe as tripas. 


Não muito longe do pombo, um largo bloco em esferovite apresentava uns tantos danos. Furos tinham sido feitos, como se produzidos pelo bico de aves. Centenas de bicadas no mesmo local até o esferovite perfurar.

As consequências de lixo nos oceanos é esta: 




Mas também é esta:



Quando era criança - altura em que ia para a praia no verão, costumava encontrar na areia pequenas pellets redondas e translúcidas. Não eram duras como os grãos de areia, nem tinham peso como os fragmentos de conchas. Eram leves como penas, pequeníssimas mas maiores que um grão de areia e translúcidas e redondas como pérolas. Aquilo instigou a minha curiosidade e quando dei por mim, gostava de as levar à boca e mordê-las entre os dentes, até as achatar. Ficavam uma espécie de plástico achatado. Acho que eram isso mesmo: plástico!

Eram exatamente assim as pellets plásticas que encontrava
na areia da praia em criança: esbranquiçadas e translúcidas,
pequenas como pérolas.
Em criança levava-as à boca e mastigava-as até as achatar.
Não recordo se as cuspia ou engolia pequenos pedaços.

Na altura em que era criança e ia à praia, ainda não se falava em poluição plástica. Mas por algum motivo ela já andava pelas dunas brancas, na sua forma mais perniciosa para o ser humano: a ingestível.  No início da década de 90, em Portugal, ainda podia ser que estivesemos no princípio do que viria a ser um consumo excessivo de produtos em plástico, mas o oceano já era poluído com os mesmos há muitos anos. Vindos de outros países, trazidos por outras correntes, presentes nas águas e ficando nos areais por décadas. Estava a envenenar-me sem saber.



Quando saí da praia, trouxe o bloco de esferovite comigo. E o coloquei no contentor de lixo. Assim como outros plásticos que fui encontrando pela margem: uma tampa de um frasco, outra de um tubo de super-cola, uma vara plástica partida daquelas que se usam para atarraxar o chapéu de sol na areia e impedi-lo de voar com a força do vento. Mas o que mais me repeliu ver na areia seca ou molhada foram as beatas! Muitas "frescas", ali acabadas de ser depositadas. Tantas e tantas... existirá poluição mais difícil de eliminar do que aquelas fibras de filtro de cigarro?? 

Bastou o sol desaparecer e dar lugar a nuvens, para a praia começar a esvaziar de humanos e a ser invadida pelas gaivotas e pombos. Algumas pessoas mais aventureiras gostam de caminhar pela areia ou praticar desportos radicais que beneficiam do "mau" tempo e de praias vazias de banhistas: skimming e parapente. Mas a presença de nuvens e o sol escondido atrás delas - por apenas umas horas pela manhã, foi o suficiente para revelar outras realidades: A «pressa» das autoridades locais em começar a dar a praia como fechada para as pessoas. 

Um estudo efectuado este ano pelas Nações Unidas revelou que 90% das águas engarrafadas tiradas para análise (num total de 259, 11 marcas de noves países onde não se incluí Portugal) continham micro-plásticos. Uma quantidade superior aos 83% anteriormente encontrados na água canalizada mundial.

O mundo como os nossos antepassados o conheceram, não existe mais. Nós o transformámos para sempre. Não há mais fontes de água pura. Comida sem ter químicos, oceanos somente com peixes. Bebés são alimentados nos primeiros dias de vida, já com contaminantes. E, segundo uma notícia que saiu hoje, 9 tipos de microplásticos estao presentes nas feses humanas. Queriam vitaminas, queriam? Ahahah. A pegada humana é demasiado perniciosa para ser eliminada. 


O Fim do Mundo não vai ser nenhum asteróide a embater na Terra, nem nenhum maremoto. É o veneno constante e silencioso da acção humana em todos os elementos essênciais para a sua saudável sobrevivência. 




4 comentários:

  1. Absolutamente de acordo. Não me canso de dizer, que o homem é o ser mais estúpido da criação. Ele cospe na água que bebe,e envenena o ar que respira.
    Abraço

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  2. Lá dizia Einstein que a única certeza que tinha é que a estupidez do Homem era infinita :(

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  3. Hello! C'est moi! lol

    É assustador ver a destruição do nosso planeta provocada por tanta irresponsabilidade humana. É que por mais que tentemos, há sempre plastico que trazemos connosco quando chegamos das compras. Seja nos sacos de legumes, nas garrafas ou naquele plastico que envolve alimentos.
    Às vezes fico a pensar como será o mundo daqui a 100 anos e só consigo imaginar aquele cenário caotico que vemos nos filmes onde só existe destruição e a água é um bem escasso...

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    1. Se continuarmos a contaminá-la, a água não só é escassa, mas rara. Vai existir a poluida que todos vão consumir porque o risco é "pequeno" e só uma minoria cheia de dinheiro é que tem acesso a água descontaminada.

      Já pagamos mais pelo "biológico" quando o biológico é natural e é a natureza que dá e graça. O manipulado em laboratório é mais barato... Só o rico vai comprar o bife de carne de boi... o pobre recebe o que dizem ter carne de boi...

      Bem vinda. Tive de a ir pescar, eheheh!
      Volte e ponha-se ao mar :)

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