sábado, 23 de maio de 2020

A fruta já não é o que era...


Acreditam que comi estas uvas ontem, dia 22 de Maio e estavam deliciosas?


Não sei o que se passa com a fruta. Temos esta concepção de que é perecível em 24, 48h, duram uns dias, vá lá. Talvez uma semana. Mas na realidade, desde a concepção à manutenção todo o processo industrial é feito a pensar em maximizar os lucros e reduzir as perdas. Dai que sejam geneticamente alteradas para saberem melhor, aumentarem de tamanho mas principalmente, durarem mais e não serem atacadas por pragas. O resultado é atingido com sucesso, mas em troca geralmente já se tem pouco de fruto. Só a aparencia dele, talvez um ligeiro gosto e, como extras, uma serie de produtos quimicos e geneticos invisíveis que todos ingerimos sem saber bem se nos vai prejudicar.

Por vezes imagino o que terá sido, em tempos idos, colher o fruto da árvore e simplesmente come-lo.

Uma arvore que nao foi geneticamente alterada para produzir mais, para repelir pragas especificas, alterando assim o sabor e o seu fruto.

Se antes existiam perigos, as pessoas também os conheciam. Sabiam distinguir o que era comestível do que nao era, conheciam a época da fruta, quando a colher, quando esperar, como eliminar pragas de formas naturais. Como terá sido comer fruta assim?

Vem-me à lembrança a senhora dos figos, com quem esbarrei na rua ha mais de 10 anos. Apareceu no meu caminho vinda do nada. Um caminho que fazia todos os dias há anos e nunca que me cruzei com ela.

Pediu-me para lhe comprar dois sacos de figos. Nem me lembro quanto me pediu por eles. Mas nao foi muito. Eu é que não o sabia, porque, como lhe disse, não sou muito de consumir fruta. Se não a compro, desconheço quanto vale nos supermercados. Na minha cabeça ela pediu o justo. Comprei-lhe dois sacos que tinham cada um o mesmo peso em quilos (não lembro quanto) mas percebi que ela queria que eu levasse mais dois, porque assim mo pediu.

O que eu ia fazer com quatro sacos de figos?? Disse-lhe que me bastavam dois.

Lembrei-me de uma colega no emprego que sempre me dizia adorar fruta. "Eu como muita fruta. Alias, tenho de ir comprar laranjas que acabei ontem". Umas vezes fomos de carro até à feira local para ela a comprar. Por isso pensei imediatamente nela e decidi partilhar com ela metade dos figos no saco. Eu certamente, não seria capaz de comer tudo aquilo, sou muito esporádica no consumo de fruta. Assim que entrei no escritório, dei-lhe um saco. Fiquei com o outro.

"Porquê estás a dar-me figos?"- perguntou ela desconfiada.

Expliquei que uma senhora mos tinha vendido e eu comprei-os para a ajudar e porque pensei nela e o quanto proclama adorar consumir fruta.

A colega mencionou que hoje em dia era perigoso, alguem podia colocar veneno na fruta, etc.

-"NÃo me pareceu ser esse genero de pessoa. A senhora pareceu-me precisar mesmo de dinheiro mas pretendia obte-lo de forma honesta, não queria esmola".

Digo isto porque ao tentar segurar tudo nas maos, a pequena carteira onde enfiei o passe, o cartao e umas notas caiu ao chao, espalhando tudo. A senhora ajudou-me a apanhar e logo avistou uma nota de cinco euros. Voltou a insistir: "mas tem aqui dinheiro, leve-me os outros figos".

O que ia eu fazer com tantos figos? Nem compro fruta e subitamente estava a gastar mais do que pretendido em algo que nao desejava. Por isso disse-lhe que nao. Agradeci e talvez lhe tenha desejado boa sorte.

Tambem me ocorreu pensar onde ali nas redondezas ela os tera ido buscar. Nunca vi uma figueira e palmeei a localidade toda a pe. Sera que os tirou de uma propriedade vizinha abandonada? Se calhar a árvore estava perto do esgoto ao ar livre que por ali passava e essa ideia repudiou-me. Sabia lá que figo era aquele...

Mas fiquei a pensar se devia ter arranjado forma de lhe dar os meus cinco euros para emergencias. Precisava apanhar a camioneta de volta para lisboa todos os dias e já me tinha acontecido não ter 20 centimos que chegassem. Uma vez, vi um taxi a parar para largar passageiros e decidi entrar. Perguntei ao senhor quanto ficava a corrida e disse quanto tinha comigo. Nao chegava. Garanti-lhe que subia a casa e lhe pagava o devido. Ele foi simpatico, nao levantou problemas e pelo caminho ate me perguntou se eu me importava se ele fosse apanhar a filha pelo caminho.
Conversamos e tudo ocorreu bem. Ele era taxista local e cada vez que me via a subir ou descer a ingreme rua, se pudesse, parava e dava-me boleia aquele bocadinho. Em troca deixei-lhe uma revistas que ele me disse que a filha gostava de ler e uma vez uma embalagens de sumo que me tinham sido oferecidas e nao as ia consumir todas. Pensei ca comigo: se um dia ganhasse o euromilhoes esta seria uma pessoa que ia contactar e oferecer assim, sei la, 100,  500 euros, so por ele ser como era. Atencioso com as outras pessoas.

Este tipo de pessoa e tao rara que, no minimo, merece ser recompensada pela sua forma de estar na vida, por ajudar o proximo e sentir verdadeiramente compaixao.

Bem que desejei, mas nunca mais vi a senhora dos figos. Desejei dizer-lhe que eram deliciosos, os melhores que alguma vez comi na minha vida. Ate hoje, passados 10 Anos, nunca mais comi um figo tao delicioso.

A doucura e o sabor deles fez-me desejar comer fruta desta qualidade o tempo inteiro. Salivei por mais figos daqueles. Queria encontrar a senhora para lhe dizer que lhos comprava todos e que lhe pagava ate mais por eles se quisesse. Era fruta merecedora disso. Ao contrario de muita que encontrava pelas feiras e supermercados.

E agora, por causa destas uvas ainda deliciosas (dentro dos parametros da actual fruta) consumidas passados exatamente dois meses apos a sua data de expirar, tudo isto veio a lembranca.

Gostei de recordar. Ja havia esquecido o taxista. E isso seria um esquecimento lamentavel. A colega a quem dei fruta, veio a mostrar-se de ma indole. Foi por causa dela que pedi ferias do emprego e nunca mais voltei. Ela esgotou-me e torturou-me psicologicamente, foi uma decepcao que ja estava a influenciar outros.

Este tipo de injustica sempre foi o meu calcanhar de aquiles. Devemos nos recordar das boas pessoas que cruzam o nosso caminho. E nos esforcarmos para esquecer as más.


E hoje devo isso a uma uvas!
🌈

Bom fim-de-semana a todos.
Sejam bons uns com os outros.


2 comentários:

  1. Prefiro os artigos de mercado pois nalgumas vendedoras são dos seus quintais.

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  2. A vida comercial vive para o lucro. O resto é "palha que arde sem se ver "
    .
    Bom fim de semana

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