Já me sinto a envelhecer de uma forma com a qual não me identifico. Nunca pensei que envelhecer ia perturbar-me, porque presumi que se vivia cada momento da vida em pleno. Só que não aconteceu assim. Agora a idade "apanha-me" algo desprevenida.
O que descobri é que não gosto do meu cheiro. O cheiro da minha pele é uma das últimas constatações sobre mudanças em mim que a idade me traz. Não é falta de higiene - nunca tive mais do que agora. É alteração biológica. Estranho isto, não é? Não me identificar com o meu próprio odor corporal!
Não tresando - sosseguem. Mas tenho um suave trave a algo que estranho, me desagrada e não me é familiar. Tomo banho e visto roupas perfumadas, acabadas de lavar na máquina, deito-me em lençóis lavadinhos.
Será que é das máquinas de lavar? Todos sabemos mas escolhemos ignorar, que são reservatórios imundos por dentro cheias de bactérias e contaminantes. Experimentem lavar as roupas sem recorrerem a amaciadores perfumados e vão sentir um odor desagradável, que detergente e água não elimina.
Com tudo lavado e fresco, sinto-me bem. Mas isso pode durar apenas umas horas. Em menos de um dia, já não sinto as roupas agradavelmente aromáticas e o odor das mesmas mistura-se com um outro que não me agrada. Busco perceber de onde vem. Quero eliminá-lo. Lavo tudo: lençóis de cama, toda a roupa, colchão, passo detergente aguado na carpete e salpico os cortinados com aroma de lavanda. OK. Agora sim! Vou viver num espaço permanentemente agradavelmente perfumado - penso. Passadas umas horas, depois de estar deitada na cama com lençois lavados, vestindo roupa lavada e fresca, principalmente se adormecer, ao despertar já sinto um suave "trago" a cheiro corporal que me desagrada. Só pode emanar de mim, mas não o reconheço.
Será isto a que chamam "cheiro de velho" ?
Encontrei uma fotografia onde estou debruçada sobre um bolo com velas acesas e um gigante número indicando: "35".
O que me lembrei ao ver aquela fotografia, foi que já me sentia no final da vida, sem muita esperança. Uma autêntica parvoíce! Mas também recordei-me das razões que me levavam a sentir assim: Naquele instante de celebração que devia ser feliz, todos na família me disseram que estava velha. Lembro-me em particular de uma frase habitual, sempre dita pela minha irmã com um tom de prazer na voz: "Estás a ficar velha, vais ficar para tia". e que os outros repetiam. Neste instante desta foto em particular, lembro-me que reforçaram a dose e me disseram isto, que instantaneamente senti como uma ferroada em mim: "Tu nunca vais ter filhos!
Porquê deixei? Porquê me abandonei? Porquê não combati eu esta opressão? Porque não me rebeliei - que é o que a juventude DEVE fazer?
O tempo passou e eu fui deixando que passasse. Agora estou desfasada do mesmo e o que ele me traz é justíssimo - só não foi justo não ter vivido com o tempo.
Podem até me ter dado vinte e poucos anos recentemente. Podem achar que estou ainda na casa dos trinta. Podem dizer-me que pareço mais nova. (será que pareço? Não acho mais!). Mas é o meu corpo que escuto, que vive comigo e que me mostra, por vezes de forma cruel, que o que as pessoas dizem não corresponde à realidade.
Um destes dias o corpo colapsa de vez, tudo fica flácido, mostrando todo o seu horror e desmistificando de uma vez só o real tempo que estou sobre esta terra.
Talvez seja temporário e depois volte o cheiro bom, espero que sim e daqui a alguns anos poderás estar a olhar para este dia e a pensar que eras jovem nesta altura - e talvez com um pouco de sorte também possas pensar em tudo de bom que se passou desde então, se calhar até flhos e tudo. um beijinho e uma boa noite
ResponderEliminarTenho quase a certeza que daqui a uma década ou mais, vou lembrar deste post e dizer: "Quem me dera ter o cheiro daquele tempo!" Ahah. A coisa só pode piorar. CURIOSIDADE: Será que é por isso que só agora acho piada a perfumes quando antes podiam me oferecer os melhores do mundo que aquilo não me dizia nada?
Eliminar(o meu cheiro era o melhor ahaha).
Obrigada pelas tuas palavras. Tudo de bom.
Vou fazer 59 daqui a dias.
ResponderEliminarE nem penso nisso.
Bfds
Parece-me a mim Pedro, assim pela superficialidade com que se conhecem as pessoas no ciberespaço, que o Pedro viveu a vida em pleno. Sendo feliz em praticamente cada etapa. Assim sendo, porquê haveria a idade de lhe pesar nos ombros? Continue leve! BFDS
EliminarO seu post é muito cruel consigo mesma. Não se considere velha, porque não o é ainda, na realidade está a passar uma fase de transição, uma fase pessimista.
ResponderEliminarAproveite, faça o que gosta. Não casar, não ter filhos não é uma fatalidade, pode se viver feliz na mesma. Tantas coisas que pode fazer...
Felicidades. Um beijinho de ânimo. Maria
Por vezes escrevo em momentos reflexivos com uma profundidade mais pessimista, Maria. Acho que faz parte do ser humano. Uns dias vemos o céu azul e brilhante, outros só o cinzento e tristonho. Faz parte. Ao olhar para trás, a tristeza do que "não foi" e com tanto potencial para ser. Olhar para a frente, descobri que não me seduz e não é para ser. Deve-se viver sim, é no PRESENTE. Porque quem vive no presente, vive intensamente.
EliminarFui criada para adiar tudo e aguardar até "um dia". Não tive hipóteses, foi uma imposição. Tudo o que desejei ou senti vontade de fazer era "para outra altura". Isso mata algo dentro de nós. Por vezes essa consciência vem à superfície e fica claro o desperdício. Mas como disse, é o presente que importa. Porque o passado já foi presente e também o desperdicei a reflectir no desperdício do passado :)
obrigada pelas suas palavras.
Bom dia
ResponderEliminarConfesso que nunca tive essa sensação e estou a chegar aos 66.
JR
Olá Portuguesinha!
ResponderEliminarAcho que entendo o que queres dizer.
Não se trata só do odor corporal mas também do apercebermo-nos que já não vamos para novas. Eu confesso que aos 28, quando vi o meu primeiro cabelo branco, fiquei triste. Para mim era associado à velhice e subitamente achei que era velha. Agora tenho mais alguns mas nada de alarmante.
Já noto que a minha pele nao é tão firme como dantes e se franzir a testa, vejo as rugas que antigamente nao via.
Mas fazer o quê quando não temos aquele dinheiro que as celebridades têm e por isso parecem muito mais novas do que realmente são? (isso e uma boa maquilhagem, claro).
Quanto ao facto de nunca ter filhos, não é coisa que me preocupe. Sinceramente até é um alivio.
Por isso, não te preocupes! haja saude e muitos anos de vida para podermos apreciar as marcas que o tempo vai deixando.
Kiss kiss
Ana, se morrer saudável, capaz de correr a maratona e fazer o pino, então valeu a pena! Aahah.
EliminarA SAÚDE é a nossa maior riqueza.
Não é cliché é a verdade.
Sim, abordei este assunto porque sinto que entra na categoria de temas-tabu. Ninguém quer falar dele. Mas não vejo problema em falar disto. A ciência já comprovou que esta alteração de cheiro existe. Ora, se ao nascer cheiramos tão bem e com o tempo perdemos esse cheiro, com mais tempo ainda ficamos mais para "flor murcha" do que "flor a florir". Ahah.