terça-feira, 18 de agosto de 2020

Coisas do quotidiano e implicancias fixas

 Comecou comigo a transmitir-lhe um recado:

- "O G. (rapaz da casa)  enviou-me uma mensagem dizendo que o supervisor dele vai passar por ca para deixar uns documentos".

Ela olha para mim fixamente, torcendo o canto do labio. 

Por isso acrescento: 

Acho que ele enviou o sms para mim porque tu nao costumas ca estar, e sabe que eu estou, so por isso

E continuo:

É para receber os papeis mas nao dizer que ele viajou. O G. nao quer que o supervisor saiba.

Ela começa a fazer perguntas atras de perguntas. "EU tenho de preencher alguma COISA"?  "Tenho de ir ao quarto dele Pegar algo?" "Mas quem é que vem cá"? "Mas que documentos?" 

EU, ainda ensonada e a querer regressar a cama, pensei que ia transmitir um recado curto e simples, e voltar ao sono. Mas a minha colega estava a complicar a mensagem. Como sei que comunicamos numa lingua secundaria a ambas, tenho presente que posso nao estar a ser bem entendida. Por isso repito tudo, procurando simplificar mais ainda o meu ingles. E faço-o assim:

"So tens de receber os papeis e dizer obrigada"

"Se o supervisor perguntar pelo G. dizes que ele nao está em casa e nao sabes onde foi".

E entao ela dispara esta:

- Ele mentiu-me. Se ele nao quer que o supervisor saiba que ele viajou é porque os medicos nao lhe deram autorizacao para viajar.


EU ja estava a sentir arrependimento por ter partilhado com ela a existência da mensagem.

 Quando o rapaz regressar, e bem provável que ela vá massacrá-lo com isto. 

Procurei atenuar o filme que ia na sua cabeça. Mas tambem pensei: se mentiu, é homem adulto, responsavel pelos seus actos. É escolha dele. Numa coisa ele nao mentiu: foi-lhe dado quatro semanas de baixa medica.

Ele, que ja tinha a viagem marcada, aproveitou e foi para o seu país por uns dias.

(PS: afinal, de acordo com ela, ele nao lhe enviou qualquer mensagem a dizer que estava a sair de casa para o aeroporto. A ser verdade, foi coincidencia ambos estarem online no WhatsApp e a minha impressao nao tem fundamento. Ainda que na ocasiao anterior, dias  antes, quando a nova rapariga se mudou, tivesse).

Acho que, ao fim de muito lhe falar, consegui fazer com que se dissipassem as duvidas na mente dela.

Mas a conversa nao tinha terminado. Comecou a falar do J.A. o outro rapaz da casa com quem ela antipatiza, e que regressou inesperadamente no dia em que o outro foi embora. 

Começa por me contar que teve de lhe chamar a atenção para o facto de deixar o microondas sujo, e também lhe falou dos plásticos (reciclagem). 

Eu queria regressar ao sono. Tinha entrado em casa vindo do emprego fazia apenas minutos. Recebi a mensagem de texto e quis ir dormir tranquila, sabendo que, caso alguém tocasse à campainha, o recado do G. estava dado. Mas ela empatou-me com tanta complicação e, agora, queixume.

Quando o JA chegou, aqueceu comida pre-fabricada no micro-ondas, comeu, lavou o prato e meteu os plásticos no lixo. So que estes deviam ter sido separados. Ela leva isto muito a serio porque, quando viveu em Londres, misturou o plastico no lixo normal e como resultado, teve de pagar uma multa e, por duas semanas - diz ela, nao lhe colectaram o lixo.

(Ora isto sim, é castigo!)

"Ele mente! É mentiroso. Fingiu nao saber sobre a reciclagem de plasticos". - foi a reposta que me deu quando avancei com a hipótese dele nao saber relamente que os tinha de separar, visto que tem de abrir a porta da rua para la os colocar. Nao temos um contentor proprio na casa.

Ela acha que eu sou muito credula e demasiado simpatica com ele. Disse-me que se continuar a ser boazinha, ele depois faz tudo o que lhe apetece. 

E quem sou eu para refutar esta possibilidade??

Tendo passado pelo que passei, sei que ela pode estar 100% correcta. 

Acho que é exagero e IMPLICANCIA de sua parte. Mas dou graças a Deus por ela existir na casa. Por enquanto, pelo menos. Faz bem ter alguém assim. Equilibra com a minha pessoa. É como dois pratos de uma balança. Mesmo complicadinha e sabendo que esta forma se ser dela pode virar-se contra qualquer um de nós a qualquer instante, gosto que esteja a viver aqui. Nao é má pessoa. Acho mesmo que não é.

Há muita coisa que os outros fazem, que ela nao gosta. E não se coibe de o dizer.Há sempre algo, mesmo numa primeira impressão. Agora disse-me o que nao gosta na nova rapariga: ela deixa um copo ou caneca em cima da bancada da cozinha, ao lado do lava louças.

"Tambem e dela isso" - e aponta para o ferro de engomar, decerto deixado em cima da bancada para arrefecer. Depois será arrumado de volta no lugar onde foi encontrado. Não vi nenhum mal nisso. Mas a M. começa logo a antecipar conflictos.

"Espero que seja só um dia e que nao comece a deixar coisas pela cozinha. Porque é assim que começa".

Nisso também tem razão. Mas nao ha como nao apreciar a ironia de ser ela a queixar-se do copo deixado na bancada, eheh.

A primeira coisa que notei quando me mudei foi a presença diária de um copo com água em cima da bancada, ao lado do lava louças. 

Vim a constatar ser a M. (Esta rapariga), que todas as manhas o deixava ali.

Coincidência, a nova rapariga escolheu o exato lugar da outra para fazer o mesmo. E nisto, ela deve ter eliminado o hábito.

O problema da M. é não perceber que nisto de partilharmos casa há que existir alguma tolerância. Nao pode ser tudo a "ferro e fogo". Ela nao percebe que também tem coisinhas que deixam os outros enervados. O copo da outra... incomoda-a. Mas ate esta chegar, fazia o mesmo.

E tem mais: ela nao limpa o fogao depois de o usar pela manha, deixando-o salpicado de oleo. Na folga, cozinha o dia inteiro, nao deixa outros usarem o fogao. Tem algo no forno desde as 10 da manha, passa agora das tres da tarde. Quando prepara algo para si, deixa o chao da cozinha uma desgraça. E fa-lo sempre depois da senhora da limpeza terminar de limpar.

Pessoalmente, nao gosto de ver frascos de especiarias e embalagens de sal encostados a um canto da parede, na bancada. Acho que da um ar desleixado e existem suportes e armarios para essas coisas. Principalmente depois de viver dois anos numa casa onde estes proliferavam como cogumelos selvagens.

E sabem porque desci à cozinha?

Porque quem lá estava fazia um barulho infernal. Pancadas e afins. Eu pensava que era o J.A., da reputação que ela lhe criou. Fiquei surpresa quando a vi em casa. Mas nao devia surpreender-me ser ela a autora dos ruidos.

Ate hoje tem sido ela a unica pessoa bem barulhenta, que me interrompe o descanso e me impede de voltar a dormir.

Nao só com os ruidos la em baixo na cozinha. Neste preciso momento está no WC a fazer um barulhão. 

Abre e fecha a porta com um estrondo, entra e sai continuamente, e deve estar nas "limpezas". Ela sempre desinfecta tudo antes de usar o duche. Diz-me que é por causa do J.A. que o consegue "cheirar" e mímica um arrepio de repúdio.

Outra conversa que tivemos quando lhe contei da mensagem, foi sobre o tapete do WC. Ontem, no duche, reparei que pequenos salpicos de agua vao sempre cair perto do tapete. Nao ha volta  a dar. O posicionamento do chuveiro, o comprimento do vidro, nada impede aquelas partículas de irem parar fora da area designada do chuveiro.


O chão fica molhado e o tapete também.  Ora, eu sou mulher de solucoes. E como o WC tem uma barra a dar sustento ao vidro com a parede, da perfeitamente para colocar uma cortina. Mas sei melhor do que fazer o que me apetece sem perguntar aos outros se estao de acordo. Entao abordei-a:

- Era para perguntar a ti e ao J.A. se concordam em por uma cortina de chuveiro no duche. É que ontem tomei um banho mais prolongado e percebi que, por mais que posicionasse o corpo ou o chuveiro, pequenas gotículas de agua sempre caem no tapete. 

-Pus o tapete la fora a secar e ia para o colocar se volta ca dentro, mas ainda nao estava seco. 

Ela começou a dizer que ele deixa tudo molhado. 

- Nao foi ele, fui eu. - repeti. Fui eu que molhei o tapete e o coloquei a secar la fora.

Ela simplesmente quer que o rapaz seja culpado por tudo. É melhor nao me meter muito no barulho, senão ainda levo por tabela. 




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