quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Adoro Televisão!

Televisão Digital: a ditadura

No que diz respeito à evolução na tecnologia, o cidadão submete-se muito mais do que manda. Os interesses económicos ditam o fim do sistema analógico e estão em guerra para ver qual dos sistemas digitais, o HDD ou o Blue Ray vão ficar com a grande fatia do mercado. E nós? Submetemo-nos, porque mais nada podemos fazer.

A televisão Digital irá ser uma realidade definitiva em Portugal. No Brasil a cidade de São Paulo emite totalmente em digital desde 2 de Dezembro de 2007. Mas questões levantam-se, uma vez que o governo não decide se vai permitir o bloqueio do sinal para gravações.

Ou seja: ao nos enfiarem o sistema Digital pela garganta abaixo, estão é a introduzir um meio de terem mais poder e ganhar mais dinheiro. Para funcionar, é necessário uma espécie de “power box”, semelhante à fornecida pela TV Cabo Portugal, a tal que já provou que a imagem digital estagna e apresenta defeitos de pixéis. Um extra de plástico que o sistema analógico dispensa. Se for proibida a gravação de todos ou apenas um programa que seja, cá está o melhor direito do cidadão que tem televisão a ir embora: gravar o que vê. Vamos pagar, claro. Pagar mensalmente para ter este “luxo”. E se quisermos mais canais, “especiais” também pagamos mais uns extras. Pagamos também a power-box. Pagamos os “vídeos on demand”. E vamos comprar as séries que tanto gostamos, porque não dão para gravar da TV.

É isso que se ganha com a TV Digital. Tudo o resto acredito realmente, é treta!

Faz-me lembrar a sociedade de hoje, que nos impinge uma série de produtos de plástico sem utilidade alguma e faz as pessoas sentir que precisam daquilo para algo. Tal como os brindes do Happy Meal do MacDonalds!

Sempre tive televisão. E tenho muitos programas gravados nela. Primeiramente, recebi esta maravilha tecnológica por uma antena no telhado. Depois uma só antena não era suficiente- disseram. Muito melhor era a imagem por satélite! Isso é que era bom, era só vantagens. Então, passei a ter televisão por satélite. Poucos anos depois surgiu o cabo. Isto era a melhor invenção de todas! O sinal viaja debaixo da terra, o que garantia a melhor qualidade de imagem sem o risco de trovoadas estragarem algo, o vento, as intempéries do tempo… a televisão por cabo foi “vendida” ao povo português como a segunda maravilha do mundo da televisão! A primeira claro, sendo a própria. Então passei a ter televisão por satélite e por cabo. O cabo oferecia também um pacote especial, interactivo, onde podia consultar a programação, ver programas quando me apetecesse etc. Um serviço muito publicitado, amplamente introduzido no mercado no intuito de levar o povo a aderir a esta MAIS dispendiosa mas imprescindível tecnologia. Só que o resultado ficou bastante a quê das expectativas. E a TV Interactiva nunca viveu um boom.

Agora vem o Digital e o que nos garantem é um leque de maravilhas para os sentidos. Promessa essa que, se formos a ver, é sempre a mesma para cada mudança introduzida no mercado. Como as pessoas engolem sempre o mesmo argumento, é que é o mistério.

Do novo sistema de transmissão de televisão digital espera-se imagens PERFEITAS, livres de fantasmas e chuviscos (onde já ouvi isto antes? Mas isto já não foi cumprido?). De promessas seguem-se tudo o que é supérfluo e não “pegou” com a TV Interactiva: tv nos telemóveis, interactividade diversa… tretas. As tais merdinhas de plástico que estão sempre a impingir.

A verdade verdadeira, a derradeira verdade, é que o povo quer é acender a televisão, mudar de canais e só. Tudo o resto é treta. Tudo o resto é supérfluo, disso não precisamos nem tão pouco vamos usar.

A verdade verdadeira e derradeira é que as imagens que gravei do tempo em que estas se recebiam pelas ondas hertezianas da antena no telhado, mesmo gravadas por vídeos mono e tecnologicamente pouco avançados, apresentam melhor qualidade que as que gravei posteriormente, nesse então maravilhoso “futuro” tecnológico, de áudio digital e stereo, prometido pela tv por Cabo que afinal tinha á mesma fantasmas, chuviscos, ausência de legendagem ou total desorganização na mesma e a imagem a desaparecer frequentemente, coisa que a antena no telhado nunca deixou acontecer. Com a antena no telhado não pagava todos os meses para ter televisão. E as imagens, garanto, são hoje mais resistentes. Algumas foram copiadas para outra cassete de vídeo e sobreviveram até estes dias como cópias. Mas estão melhor que originais modernos.

Portanto: estão ou não a querer entrar no nosso bolso em troca de uma ditadura? Sabem que mais? Eu só quero aquela antena no telhado, contento-me com 4 canais (para quê 40 se não se vê nenhum?) e até, com apenas um aparelho de televisão. E quem sabe, um dia, até este não desaparece?

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

112

Nunca na minha vida tinha precisado chamar uma ambulância. Nunca estive internada num hospital, nunca fui ver um doente num hospital, nada sei a respeito destes ambientes. Mas depositei sempre nos serviços básicos.

Até um dia.

Faz quase um ano que fui acudir um familiar idoso, que me telefonou a queixar-se que já tinha ligado para o 112 a pedir uma ambulância cinco vezes, e que lhe desligavam o telefone. Isto é grave. Não acreditei que a pessoa mentisse, porque a mentira não fazia parte do seu carácter, parte da geração a que pertence e da vida que teve. Também não acreditei que os serviços de socorro o tivessem feito intencionalmente. Portanto interpretei tudo como um acidente.

Depois chegou a minha vez de chamar a ambulância pelo telefone. Do outro lado atende-me um operador cuja primeira questão que me coloca, é a afirmação de que já tinha ligado antes. Respondi que eu não, mas que daquele número já se tinha tentado fazer a chamada. O operador diz para aguardar para ver a disponibilidade de ambulâncias. Aguardo. Não têm ambulâncias e o operador diz para ligar para os bombeiros. Peço-lhe o número, anoto-o e faço a ligação. Vai parar à casa particular de um senhor que adivinho familiarizado com aquele tipo de telefonema, e que depois apressadamente me corrige e desliga o telefone. Ligo então para os bombeiros. Música. Escutei muita música, o que conseguiu deixar em mim, uma pessoa calma, uma impressão de nervosismo. A voz do outro lado, sempre aquela voz que parece vir de uma pessoa humilde e sem muitos estudos, prontifica-se a verificar se podem prestar auxílio. Mais um pouco de música e a resposta regressa não.

Entre gemidos, telefonemas por telefone e telemóvel, terminei a pé, a amparar o idoso que se queixava de dores abdominais, até uma praça de táxis. Para ele estava a ser difícil aceitar que a ambulância não tinha vindo. Já havia chamado antes e esta vinha sempre. Repetiu isto umas três vezes até que lhe respondi: da próxima vez já sabe: chama um táxi!

A próxima vez não demorou a chegar. Essa vez foi fatal. Morreu, sem ter encontrado um táxi que o levasse até ao hospital.

Até ter surgido nas notícias o caso do falecimento de duas pessoas por falta de socorro de ambulância, não tinha entendido a severidade do que vivi. Lidar com a morte de alguém, quando as circunstâncias podiam levar à vida se o socorro chegasse a tempo é muito doloroso. Todos se responsabilizam um pouco pelo sucedido e leva tempo até nos sentirmos perdoados.

A fé que depositei no sistema era então praticamente cega. Cheia de compreensão, entendimento. Se argumentassem que existem poucas ambulâncias, aceitava, compreendia. Sempre tive presente que uma ambulância só se chama em caso de emergência. Sou do tipo que fica a gemer de dor sem ir logo pedir ajuda. O idoso em causa não. Tinha dores, ia para o hospital. Sabem como a sociedade em geral vê as pessoas assim? Recrimina-as. Estes são os “chatos”, que chamam uma ambulância por qualquer coisinha. São os idosos que “não têm nada” e ocupam o tempo precioso dos auxiliares médicos. São os familiares “chatos” que querem ir sempre para o hospital e pedem ajuda. É assim que nós, como indivíduos nesta sociedade vemos, por vezes, aqueles que pedem ajuda.

Eu não sou assim. A sociedade preparou-me bem para não a chatear quando estiver doente. Estou sempre bem. Qualquer dor é passageira. Uma constipação nunca é uma gripe e tudo é passageiro e não necessita de medicação.

As notícias de como funciona na realidade o sistema de auxílio por ambulâncias lembram-me sempre da morte deste idoso. Ele é que agia correctamente. Por vezes ia sozinho de táxi para o hospital a meio da noite, outras vezes chamada uma ambulância. Mas nunca perdeu, como eu perdi, o valor de si mesmo. O valor da vida. Da sua vida. Porque não haveria de chamar uma ambulância? Porque existem poucas no país? Para não aborrecer os médicos? Porque o identificador de chamadas do sistema do 112 fez a média de chamadas e analisou o grau de gravidade? Porque têm estes de decidir, com base em intuição e nada mais, quem é socorrido e quem não é?

O idoso é que está com a razão. Ele é que teve sempre presente os seus direitos. Vantagens que ás vezes as pessoas simples e de pouco estudos têm: a clareza de ver os seus direitos e deveres como eles devem funcionar.
Não somos nós que temos de nos adaptar a um sistema injusto. Que se lixe a falta de ambulâncias! Estou mal, tenho medo, chamo uma! É assim que se deve proceder. No dia em que não o fez, morreu.

Todos têm o direito a ter uma ambulância à porta, quando solicitada. Se não existem meios, criem-nos. Vendam uns tantos estádios de futebol pelo preço que gastaram na sua construção e comprem ambulâncias e dêm emprego aos desempregados qualificados que existem no mercado. Errado é não acudir.

Hoje abriu o telejornal da SIC com mais uma notícia triste destas. A notícia não deixa margens para dúvidas. É colocada no ar o audio de uma chamada telefónica entre o inem e os bombeiros. A coisa está muito mal! E vejo um ministro ou algo assim, a dizer que TODAS AS PESSOAS DEVEM RECEBER AMBULANCIA. Como o meu idoso recebeu? E outros por aí? Ainda por mais, andaram a colocar nas televisões anúncios a incentivar as pessoas a não telefonar para o 112. Anúncios que diziam que era prejudicial para os serviços atender a uma chamada de pedido de ajuda para o 112 sem ser uma emergência. Este anúncio abria dizendo quantas chamadas falsas o serviço recebe por ano ou mês e quantas vidas podiam ter sido salvas. Faz o povo sentir-se um criminoso, por querer ser socorrido.

Depois de ter visto a morte como resultado de uma destas “mensagens” de “não me incomodes” a menos que estejas a sangrar, não me fazem mais lavagens ao cérebro. Não tenho dúvidas: antes chamar uma ambulância a não chamar e alguém morrer. O idoso sabia isto. Da sua maneira. Poucos estudos, esperteza da vida, e soube mais do que eu.

Apartir de hoje vou esforçar-me para deixar a ingenuidade à porta e parar de ser tão crédula na boa vontade das pessoas e dos serviços. Temos direitos, cumprimos os nossos deveres. A vida é o bem que devemos preservar. Ela não deve terminar por falta de auxílio médico. Não por isso.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Portugal, dentro e fora

Vi num portal de emprego um anúncio pelo qual me interessei e decidi candidatar-me. A mensagem dizia para enviar um SMS com o nome e número de telemóvel. Passados dois dias decidi utilizar o contacto telefónico fornecido para saber mais a respeito da oferta de trabalho. Quem me atendeu respondeu ás minhas perguntas desta forma: “Isso é com o responsável por essa função, vai ter de esperar que lhe telefonem”.

Três vezes escutei esta resposta, para cada uma das minhas questões e afirmações:

-“Candidatei-me há dois dias e como ainda não fui contactada, decidi telefonar para este número que o anúncio também faculta” – afirmei. A voz masculina do outro lado da linha, como que maçada por o oportunar, facultou-me aquela resposta.
Expliquei que queria saber mais sobre a função, saber qual a empresa e a localização. Resposta: “Tem de esperar que lhe telefonem”.
-“Há! Mas sempre vai haver um telefonema?”
-“Tem de esperar que lhe telefonem” – novamente a resposta.
-“Está bem, obrigada. Bom dia”.

Porquê estou a escrever sobre isto? Certamente não por me agradar este caso que exemplifica a crise porque estamos a passar. O desemprego está em alta e a maioria das oportunidades que surgem são muito reduzidas e limitadas ao mesmo tipo de função. Basta abrir um site de ofertas no estrangeiro para verificar. Sinto logo entusiasmo e esperança, diante das possibilidades. Mas isso não acontece quando consulto as ofertas de emprego em Portugal.












Sou formada. Andei na universidade quando esta ainda não era uma porta totalmente aberta a qualquer um disposto a pagar para atingir esse estatuto social. Andei lá e pasme-se: realmente estudei! E mais: gostava da área, entrei na que quis, candidatei-me à universidade pública tal como tantos outros, e entrei. “Queimei as pestanas” e quase ganhei um problema mais sério de saúde. Não sabia governar a ansiedade e sempre quis fazer tudo. Mas consegui entrar e fiquei muito contente. Na altura ainda não se compravam os cursos com a facilidade dos dias de hoje. Bem, mas escrevia eu sobre as ofertas de emprego em Portugal serem o reflexo da crise que o país está mergulhado. Atenção: digo mergulhado, porque “a atravessar” implica que daqui vai sair e sinceramente, começo a crescer e a deixar de acreditar em contos de fadas.

Já fui trabalhar para o estrangeiro. Para uma situação que eu quis, por me atraírem as condições de nunca estar parada no mesmo lugar. Não era uma função que conhecesse. De facto, foi a “mais baixa” que já desempenhei, mas fi-lo sem problemas e com satisfação. Quando se faz o que se quer, não importa que também se tenha de limpar sanitas cagadas com o piaçá.

Esta experiência revelou-me porém, um lado que não conhecia e que só mais tarde, quando tudo terminou, é que tomei consciência dos preconceitos e ideias pré-concebidas que estão impregnadas pelas consciências dos indivíduos por todo o mundo.

Fui para o Reino Unido e trabalhei num meio de portugueses a atender ingleses. O nosso salário era mínimo, comparado ao que é o mínimo deles. Claro que se tratava, no fundo, de uma exploração. Tal como se explora a mão imigrante que vem para Portugal. Sempre disse para com os meus botões que, se for para ser explorada, que o seja no estrangeiro. Pelo menos não ficarei a sofrer por sê-lo no meu próprio país!

Ao verem a minha nacionalidade denunciada na estampa da bandeira portuguesa do crachá preso no uniforme, os clientes, do pouco contacto que tive com eles, enchiam-me de perguntas. Alguns tentavam mostrar o que Portugal lhes lembrava e diziam: “Oh, Portugal! Cristiano Ronaldo! Mourinho!
–“The special one! Lisbon, Algarve!”.

Nesses poucos contactos, realçou-se o preconceito e uma ignorância. Esta última não me era desconhecida. Tinha feito amizades com umas raparigas inglesas uns anos antes, quando estive em Londres no programa Erasmus. Uma coisa que me ficou na cabeça foi uma delas se lamentar por não saber falar línguas estrangeiras. Surpreendeu-se ao perceber que em Portugal estas são leccionadas na escola, aos 10 e depois uma segunda aos 12 anos. Surpreendeu-a também que falássemos inglês “very well, better than foreign students from others places” – o que nunca achei ser verdadeiro. Mas que o fui escutando, mesmo anos depois, lá isso fui.

Tinha portanto, no fundo do meu consciente, a noção de que o inglês comum está menos preparado e conhece menos do mundo, por estar mais fechado dentro da sua própria cultura e língua. Mas não estava á espera dos comentários alusivos à minha suposta vida “precária”.
Ao me verem a trabalhar longe do meu país, algumas pessoas deduziam que devia estar maravilhada por ali estar e que aquela decerto era uma oportunidade maravilhosa. De início respondia “Yes”, porque era a verdade: estava contente por ali estar. Mas não porque ali encontrei algo acima das minhas possibilidades. Na realidade, estava muito abaixo das minhas capacidades! Mas isso não me importava. Era a única que sorria de manhã e mostrava bom humor, num grupo de outros portugueses que ali estavam movidos por circunstâncias diferentes.

Um cliente deduziu que devia sentir-me maravilhada por viver naquela cidade. Uma coisa minúscula, cinzenta, sem nenhum interesse, com betão por todo o lado e ruas todas iguais. Encontrar ali um grande centro comercial com uma escada rolante, era uma festa! Mas este cliente deduziu que eu vinha da província. De um lugar onde andava descalça (barefoot- he said) e pisava terra batida. “Ho, do you like living in the city? Is much better that back at Portugal, hã? Is difficult there. There’s more to see here!”. I smiled. I normally do that a lot. To buisy working to even process the deep full meaning of those words.

O trabalho era de 12 ou 13 horas por dia, sete dias por semana. E fi-lo sempre com gosto. Uma pessoa acostuma-se. Não dava tempo sequer para pensar em nós mesmos, quanto mais em conhecer a cidade e dar passeios. Nem sabia qual o estado do tempo ou olhava para uma janela. Mas claro, os clientes não sabem isso e pensam que temos uma vida de maior liberdade. Quando me perguntavam pelo “better pay” que certamente estava a receber, ficavam de boca aberta. E não é no sentido figurativo. Abriam a boca de espanto e alguns esqueciam-se de fechá-la. Também afirmavam sempre que decerto era bom receber em libras. Quando lhes informava que o ordenado era pago em euros, é que a boca não fechava mesmo.

Trabalhar por prazer, ás vezes de graça: essa é que foi a minha desgraça! Mas o que fazer? É-se o que se é. Após esta experiência, voltei para o desemprego e para Portugal. Entrei numa profunda depressão. Pretendia voltar para Londres, de onde saí por ficar subitamente doente. Voltei para a minha “província” em Portugal: Lisboa! Mas detestaria que estas pessoas que tiraram estas conclusões acabassem por ficar com a razão. Portugal está tão mal e as oportunidades são tão escassas, que se voltarem a deduzir que venho de um país miserável, não tenho formação ou cultura, ando descalça em terra poeirenta e levo uma vida dura no campo a abrir sulcos com a enxada, espero que não se torne então verdade!

Um outro cliente perguntou-me se frequentava a rua de prostituição local. Fingi que não entendi e nem dei importância à sua observação de péssimo gosto. Assim que a afirmou logo deduziu que eu não tinha capacidade para a compreender, e riu-se. Mas nem era preciso conhecer as ruas e sua fama nocturna, quando o significado está contido na insinuação. As mulheres que o acompanhavam recriminaram-no e ele riu mais ainda. Não foram poucas as vezes que entendi que estrangeiro mulher, para alguns, representava sexo fácil. Uns copinhos a mais também não ajudava. Quando trabalhava de noite no bar era quando o meu sorriso se apagava e o contacto visual limitava-se à função. A bem dizer, no Reino Unido "copinhos a mais" é condição obrigatória todas as noites. É um estilo de vida. Ajudados pelo álcool e sem controle sobre a testosterona, os homens estavam convictos que uma mulher estrangeira tinha o objectivo oculto de os seduzir a fim de melhorar as suas condições financeiras.
Ideias pré-concebidas e depois generalizadas.




Uma parte divertida:

Coincidentemente apanhei o mesmo motorista de Táxi das poucas vezes que entrei num. O homem era simpático mas um fanático nacionalista. Para ele tudo o que era from “United Kingdom era o melhor. E lá ia enchendo os meus ouvidos de exemplos: era deles a língua mais falada do mundo. Tinham as melhores equipas de futebol do mundo. Aquela era a melhor cidade do mundo e para meu espanto até hoje, este homem não parava de falar de uma ponte local.

A melhor, única dentro do seu género, enorme, a mais larga de todas… qual Akashi-Kaikyo (caso ele soubesse qual é), qual Golden Gate! Aquela da sua cidade é que era a melhor ponte do mundo! Disse-me que detinha o recorde do tabuleiro mais comprido ou o da maior ponte elevatória. Não compreendi no meio de tanto entusiasmo.




Íamos lá passar e ele quis que o comprovasse com os meus próprios olhos. Esperava eu uma coisa fenomenal, talvez quase do comprimento da ponte Vasco da Gama, já que sabia que maior não podia ser. O homem não acreditava que Lisboa pudesse ter uma coisa maior que a que ele tinha ali na sua terra. Quando cheguei à ponte, não fiquei muito surpreendida. Tinha uma aparência moderna mas banal e fiquei com a sensação que o automóvel a atravessou rapidamente.


Como podia eu descrever a Vasco da Gama àquele homem? Nem eu própria conhecia a sua dimensão, de tão reduzidas serem as dimensões do que me habituara ver por ali. Até hoje este motorista de Táxi deve ter um conceito muuito diminuto da ponte Vasco da Gama. Da primeira ponte sobre o Tejo, já que ele quis saber quantas tínhamos em Lisboa, soube dizer-lhe que era idêntica há de S. Francisco, a Golden Gate. Mas a Vasco da Gama… nem eu mesma lembrava. Só quando voltei a Lisboa, encontrei um part-time miserável e provisório para os lados da Expo e pude respirar com saudosismo aquele ar delicioso a maresia e esgoto, é que deixei-me impregnar pela paisagem. Nunca mais vou esquecê-la. Tem uma curvatura linda. Gravei-a com os meus olhos.




Voltando ao pré-julgamentos:
Recuso-me a julgar todos por uma minoria. Ainda que fossem muitos a dar-me essa noção. Talvez hajam diferenças de mentalidade maiores de região para região. Talvez o ambiente de trabalho fosse limitado ao predomínio de um certo tipo de cliente. Ou talvez não. Talvez todos nós não saibamos nos libertar dos estereótipos e ideias pré-concebidas.

E tudo isto para dizer que estamos à mercê das empresas de trabalho temporário, e não devia ser assim. As mesmas deviam ser extintas por lei, a menos que cumprissem certos objectivos. Com o excesso de procura e a escassez de oferta, estas empresas dão-se ao luxo de seleccionar pessoas. Não de acordo com critérios decentes e claros mas sempre pela conveniência e lucro pessoal. Procuram empregar pessoas de baixo nível de formação e com poucas alternativas. Dão preferência a desesperados (quem não está hoje em dia) para os terem na mão e controlar melhor. Querem pessoas que trabalham e estão dispostas a ganhar (muito) pouco. As condições de remuneração são propositadamente confusas, para que o trabalhador não saiba exactamente quanto vai receber no final do mês. Uma coisa que este realmente não sabe é quanto a empresa ganha por o empregar. É muito. Soube de um caso que chegava ao quádruplo do ordenado do trabalhador. Vi com os meus olhos e ouvi com os meus ouvidos o acto desesperado de vários angariadores de trabalhadores para conseguir alcançar o número exigido pelas empresas no prazo estipulado, caso contrário perdiam o cliente ou um determinado nível de pagamento mais elevado. Não queriam saber das qualificações ou reais interesses dos candidatos. Queriam cabeças. Para serem pagos por cabeça. Isto dura há 10 anos, e ninguém faz nada.

Portugal, adoro-te. Mas deixas-me doente!

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008


Dificuldades numa sociedade fechada
Dificuldades numa sociedade aberta

Somos constantemente informados nos noticiários do quanto estamos abaixo da média europeia em termos de rendimento, poder de compra, salário, escolarização, formação, etc. Será que alguma vez no meu tempo de vida, vou ouvir que Portugal vai bem e recomenda-se?

1932 a 1968: Chefe de Estado: António de Oliveira Salazar

Vive-se numa sociedade fechada ao exterior. O povo vive na miséria interna, oportunidades para lhe escapar são poucas e implica arriscar tudo e deixar tudo para trás.
A Salazar atribui-se actos de opressão e violação dos direitos humanos.
Figura não-grata no panorama histórico de Portugal, ao menos até a sua eleição no programa “Grandes Portugueses”.
Chefe do Estado Português quando existiu a PIDE.
Figura a quem se atribui a culpa pela pobreza, miséria e fome por que passou o povo.
Figura que lhes tirou a liberdade.
Homem que manteve Portugal na neutralidade aquando a 2ª Guerra Mundial.


2000 a 2008:
A sociedade portuguesa não está mais fechada. Ao contrário: está escancaradamente aberta! No entanto, uma coisa não mudou: continuam as dificuldades. E para lhes fugir, a opção parece permanecer a mesma: abandonar tudo, deixar tudo para trás e partir, sem garantias, rumo a uma vida noutro lugar.

Primeiro-Ministro: José Sócrates
Presidente da República: Cavaco Silva

Porta aberta, ou porta fechada, afinal, porque estamos mal?