Metereologia 24 h

Mostrar mensagens com a etiqueta velório. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta velório. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 1 de maio de 2019

Velórios e últimos adeus

Até este momento da minha vida ainda só estive presente em três velórios.

Os dos meus avós e o de uma irmã de um deles.

O que retirei desta experiência é que cada um é diferente
E é assim mesmo que tem de ser. 

Estava aqui a pensar e subitamente percebi que é até possível um dia não vir a estar presente num velório, mesmo sendo o de uma pessoa de quem gosto ou tenho por laços de sangue obrigação de lá estar. Não fará de mim uma pessoa que goste menos ou mais do falecido. E o julgamento de terceiros não devia condicionar.  


Digo isto porque, como disse, cada um foi diferente. No primeiro, fui ao velório e fui à cremação. No segundo, fui ao velório mas não à cremação. Sabia que a pessoa não queria ser cremada, embora um familiar tivesse garantido que sim e os outros foram atrás por acharem a ideia bem mais cómoda e repudiarem a existência de um corpo enterrado e o seu lugar assinalado com uma lápide. Como se isso fosse um absurdo, quando o sepultamento tem sido a prática de gerações e gerações. Depois acrescentaram não estarem para "ter de cuidar da manutenção da campa". Como se isto fosse sobre eles, e não sobre a pessoa falecida e o seu último desejo.

Não fui e não senti falta de ir. Nem precisei, escutei a voz da pessoa que faleceu aquando o seu velório, logo após os procedimentos do padre. Mais ninguém pareceu escutar e eu soube o que ela queria e fiz-lhe a vontade. 

Ela falava a rir, daquela maneira que ria quando era viva, estava ali presente, claro, como estaria também se viva fosse. Gostava de ver o que estava a acontecer no momento e estar com pessoas. Já o meu avô esteve ausente no seu velório, só "apareceu" no final, depois da cremação consumada. Queria nos tirar o pesar, estava incomodado com ele quase sem o entender. Fazia questão de repetir que estava bem, que nunca se sentiu melhor. Estava feliz, podia correr, tinha energia e estava com uma pessoa querida. 

Se não quiserem não acreditem mas isto aconteceu. Acho que se os mortos "falam" do além, fazem-no com todos. Mas escuta apenas aqueles que estiverem na frequência certa, num momento em que se torna possível. E lá por acontecer uma vez, não é garantia que acontece mais. São muitas as variantes.  

Mas isto para dizer que contemplo a possibilidade de um dia não comparecer nem a um velório, nem a uma cremação/enterro. E se calhar, talvez compareça a todos ou, com sorte, somente ao meu. 

Gostava de ver todos a serem eles mesmos, sem máscaras. Mas há quem use máscaras a vida inteira e assim, quando uns aparecem para velar o morto, é como se aparecessem para o enterro de um desconhecido. Vêm prestar um extremo pesar junto à família por alguém que só existiu para eles. 

Isto faz sentido? 

Sim, faz. Basta pensar quando um artista morre. As massas entram todas em luto mas só a família sabe realmente quem era a pessoa que estão a velar.


Estava no facebook quando vi o post de uma pessoa que conheço bem. E o que ali aparece não é o que a pessoa é no dia a dia, sem os "holofotes" das atenções de terceiros. Imaginei aqueles que comentam o post a aparecer ao velório... transtornados, como se tivessem perdido a pessoa mais simpática do mundo. Mais um dos "bons e justos" que se vai, etc. etc. 

Ao perceber isto pensei que não ia gostar de estar presente.
Mas a vida é assim mesmo e não admitir que seja também não ajuda ou altera seja o que for.
É navegar com a corrente?





quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Lidar com a morte

Recentemente estive num velório. 
Ao avistar a pessoa no caixão, só consegui perceber que ali dentro estava alguma coisa. E como sabia o que é suposto ali estar, o cérebro fez o resto: imaginou.

Só que quando não se vê e só se imagina, a imaginação pode ir para vários lugares. 

Dias depois, do nada o meu pensamento volta a ir para um lugar onde já esteve antes, em circunstâncias parecidas. E volta a questionar-se sobre o que, na realidade, não viu.

O vulto deitado ali, além de mirrado, pareceu não ter as pernas. Os contornos do próprio corpo humano pareciam indefinidos, tantos eram os lençóis esticados que o impossibilitavam. O rosto tapado por um pano maior do que um lenço, dava a sensação de querer engolir o que estava por baixo tal e qual aquele monstro do filme Alien.

Tapar, tapar, tapar... esconder. 

E a imaginação fantástica entra em acção:
- Será que era mesmo aquela pessoa ali em baixo?
- Será que lhe tiraram as pernas?

Não sei quando (a sociedade) começou este medo de encarar a morte, mas creio que não é saudável. 





segunda-feira, 17 de março de 2014

Já não existem Compadres


Já se passaram muitos anos mas ainda hoje recordo da presença de um casal de pessoas mais idosas presentes no velório de meu avô. E ainda quero saber quem eram. Quando ia para lhes perguntar, logo após os cumprimentar com um beijo, uma tia chamou por mim e acabei por não saber quem eram essas pessoas. Pensei, na minha inocência, que alguém ali saberiam quem eram. Ninguém sabia. E até hoje não sei quem eram aquelas pessoas. 

Será que sequer conheciam meu avô? Poderão ser dois «intrusos» que gostam de se introduzir numa multidão em luto por algum tipo de excitação pessoal? Ou terão se enganado na sala e não o perceber por nem conhecerem o rosto do falecido?

Não sei porquê mas por vezes esta história me ocorre. Será pelo mistério?


Conhecia todos no velório. Eram família. Nenhum rosto não familiar compareceu. Meu avô tinha amigos, ou colegas, não sei. Outros com quem se dava que eram da sua geração. No entanto nenhum desses rostos apareceu, nem amigo nem vizinho. É engraçado como nos lembramos disto. Uma vez estava a ver um programa na televisão em que depois de um velório a viúva diz isto: porque será que mesmo entre toda a comoção eu me lembro exatamente de quem apareceu e quem esteve ausente? Não queria ser mesquinha e ter estes  pensamentos...

Não é mesquinhez, é curiosidade e é um facto que fica e faz reflectir. Meu avô tinha conhecidos. Será isso? Quando ele falava de uma antiga amizade, sempre se referia à pessoa pelo nome, antecedendo da palavra compadre. Acho tão bonito! Compadre Joaquim, compadre Manuel... Mas normalmente logo a seguir referia o cemitério e o número da campa onde o «compadre» já se encontrava a habitar. No entanto ele não foi o último «resistente». Viu muitos partirem antes, é verdade. Talvez do grupo mais próximo quase todos tenham partido antes dele. Mas pelo menos um lhe sobreviveu. Pelo menos um teve de sobreviver e muito provavelmente foi aquele que o roubou depois de morto. (mas essa é outra história e não me apetece contar).


O seu velório teve a presença de algumas muitas pessoas. As que importavam. A família, que é numerosa. Mas eu fico a pensar se se pode medir o carácter de um homem (ou uma mulher) pela quantidade de «afluência» de vivos no velório. Quero dizer: conheci uma ou outra boa pessoa que morreu só. Talvez exatamente porque sempre foi boa demais. Boas pessoas, pobres e sem familiares não têm muitos a querer prestar a última homenagem. Não terão, provavelmente, quem vá depositar umas flores na campa. Contudo, de a pessoa for uma celebridade, aí muita gente comparece. Se a pessoa morrer de morte trágica e injusta, uma multidão aparece. Mas se não existir nada disso, quem aparece?

Imagino o meu velório (que gostava de NÃO ter). E imagino-o às moscas. Com um, dois, ou três gatos pingados, que comparecem de rapidinha para fazer a última homenagem. Talvez levados por alguma comoção e emoção de momentos do passado. Mas partindo do pressuposto que morrerei muito idosa (infelizmente e felizmente), já não terei pais para comparecerem ao funeral. Não terei filhos nem netos porque não providenciei nenhum. E os «postiços» pertencem a quem os pariu. Terei talvez umas caridosas almas. Mas sabem? Não é ideia que me incomode ou que pense muito nela. O que acho importante é a vida que a pessoa levou e a consciência com que parte, não a quantidade de ligações de interesse que estabeleceu. Prefiro uma lágrima a uma choradeira desenfreada e prefiro, sinceramente, uma única e sincera reza (nem que seja a do padre) do que uma só não sentida ou forçada. Enfim... considerações :D