Quando cheguei a Portugal contaram-me que a seca fez com que ficasse a descoberto uma ponte do tempo dos romanos, em Alcácer do Sal, que ninguém punha a vista em cima fazia séculos. A minha curiosidade ficou ao rubro. E eis que encontrei na internet essa notícia, em duas fontes audio-visuais diferentes: TVI e RTP.
Para meu (pouco) espanto, ambas as notícias, sobre a mesma ponte, contam histórias diferentes.
Afinal, como suspeitei, a história que me foi contada não é autêntica (a fonte deve ter sido a TVI).
A realidade é que a existência da ponte, normalmente submersa pelas águas da barragem do Pego do Altar, no rio Mourinho, era do conhecimento da gente local. Um miúdo mais novo que eu lembra-se de, em menino, ir para lá pescar com o pai. Ora, sendo assim, a reportagem da TVI, intitulada "Seca mostra ponte que não se via há 60 anos" já começa no erro.
No meu entender a TVI apresentou uma notícia muito mal construída, vergonhosa, com factos errados, superficiais e nada fundamentados. Datada do dia 28 de Setembro, devia fundamentar-se em factos conhecidos e já divulgados na véspera pela imprensa escrita, que suspeito ser onde os jornalistas das TVs vão todas as manhãs para obter fontes. O jornal Diário de Notícias, ao abordar o assunto no dia 27, facultou dados que contradizem os da TVI no dia seguinte. Em que ficamos?
Foi TENDENCIOSA e superficial a forma como a TVi reportou esta notícia da descoberta da ponte em Alcácer do Sal, colocando unicamente o depoimento de pessoas que diziam nunca ter conhecimento da mesma. O «jornalista» repete que a ponte nunca foi vista por "esta geração" (e qual é "esta"? A do jornalista? A das pessoas de mais idade que entrevistou? Ou qualquer outra que ignorou?) e acrescenta «diz-se ser do tempo de napoleão». .
Diz-se... "pode ser e pode não ser". Como não sabe, diz que «pode ser». E quem é que diz isso? Tudo bem se, de facto, fosse impossível saber-se quando a ponte foi feita, porquê e por quem. É esse o caso?
Não. Porque outros jornalistas, de outras fontes que encontrei, souberam responder a estas questões. Penso que até um idiota sabe que o «quem, quando, como, onde, porquê, o quê» são a base das notícias, tal como sempre foram a primeira coisa a ser contada em qualquer cusquice. E se outros descobriram esse facto, então foi preguiça do jornalista que não fez o trabalho de investigação que toda a peça - mesmo estas com este teor light- precisam. Não contente com o superficial trabalho, ainda aparece na própria peça, para repetir a rala e duvidosa informação que disponibiliza: a ponte não era vista «nesta geração» - informação repetitiva, por isso mesmo desnecessária e dispensável. Mesmo que não fosse, podia muito bem (e devia) continuar a ser contada com imagens locais. Mas não. O experiente jornalista teve de meter a sua cara junto com a notícia, para, suspeito, satisfazer o curriculo da vaidade...
Comparativamente, a jornalista da RTP fez o trabalho de casa e pelos vistos, encontrou informação sobre a ponte. Informa que a última vez que ficou à vista foi em 1999 (e não há 60 anos), entrevistou pessoas que assim o atestam e mais: sabe QUANDO a ponte foi construída: 1815. Ao entrevistar o presidente da união de freguesias de Alcácer do Sal (alguém com credenciais), ficou a saber que a maior ameaça à ponte são os turistas que aparecem e levam uma pedra para "recordação" e mostrou o acesso à mesma a ser vedado. Achei bem mais interessante falarem da ponte e não dos peixes que ficam nas poças... Que é o que acontece nas secas e não acrescenta novidade nem é sobre a ponte em si.
Dois jornalistas televisivos, duas formas tão diferentes de dar uma notícia. Um muito experiente, outra desconheço, mas vou deduzir menos experiente.
Isto de se ser bom naquilo que se faz tem muito pouco a ver com os anos de experiência. Descobri este facto há pouco tempo, apenas. Uma pessoa pode ter fama, reputação e assim a manter por anos até a sua morte. Sem que a mesma corresponda à verdade. É comum todos os outros serem capazes de fazer o mesmo, mas cinco vezes melhor. Porém, por vezes quem já apanhou com luzes de estrelato, continua debaixo delas, sem mérito para tal.
Vejam ambas e digam-me o que acham destes dois exemplos de trabalho jornalístico.
Não é novidade que as notícias da TVI servem mais para desinformar do que o contrário.
ResponderEliminarAbraço e boa semana
O jornalismo anda cada vez mais no lixo.
ResponderEliminarInfelizmente essa é a dura realidade.
Eu vi essa reportagem.
ResponderEliminarÉ o jornalismo que nós temos. Levamos com noticias repetidas dias a fio até aparecer outra noticia para substituir a que já está batida.
Kiss