A M. veio cobrar-me que dissesse ao novo inquilino que a incomoda quando o cheiro de cigarro se sente no interior da casa. Ela tinha a certeza que ele estava a fumar dentro do quarto. "Tens de dizer alguma coisa. Sou sempre eu. Nunca dizes nada a ninguém, dizes a mim".
Mas está errada.
Enquanto rezava por dentro para que ela me deixasse jantar em sossego indo-se embora, já que me seguiu assim que saí do quarto no intuito único de me dizer isto até a exaustão, tive outra epifania. Mais uma vez, ate nisto, ela descreve-se a si própria.
Temos maneiras diferentes de ser. Eu abordo as pessoas quando sinto que chega a altura. Dois dias antes, tinha abordado o rapaz Nº2 e perguntei-lhe se podia evitar deixar que as portas fechassem com um estrondo. Desse ponto a diante, senti claramente que ele fez um esforço nesse sentido. São três portas, que ele abre sucessivamente e deixa que fechem com um estrondo, atrás de si. Há noite torna-se mais incomodativo. Incomodava todos, mas não soube de ninguém que o tivesse abordado sobre este assunto. Já não é a primeira vez que o abordo sobre este tema. Logo no início, quando se mudou, como eu trabalhava às noites não fazia ideia do barulho das portas. Duas semanas foi o tempo que levou para o perceber. E aí disse-lhe. Logo a seguir a M. veio perguntar-me/afirmar:
-"Disseste-lhe alguma coisa, não foi? O que foi que lhe disseste?"
-"Ah, nada... não aconteceu nada de especial".
Vejam bem: quando o abordei era bem tarde de noite, eu e ele estavamos na cozinha e os outros fechados nos seus quartos à tanto tempo, que seria de supor que já teriam adormecido. O quarto dela fica no piso superior, no topo das escadas. Se nada provasse que estão sempre a escutar quando alguém partilha um diálogo nas áreas em comum, isto prova. Ela estava a prestar tanta atenção, que entendeu que não era conversa casual e sim um pedido para que alterasse um comportamento.
No fundo ela só sabe é gerar conflictos. E não é muito boa a selecioná-los. Noutras ocasiões em que muito queixume ela fez aos meus ouvidos, acabou por ser a minha iniciativa que conduziu a frutos definitivos. Ela queixa-se, diz que não aguenta mais, que vai sair desta casa, porque indivíduo X, Y, Z é porco, não sabe estar, etc, etc... mas não toma uma atitude mais séria. A não ser mostrar o seu desagrado fazendo mais barulho, sendo desrespeitosa, tendo discussões e deixando bilhetes intencionalmente direccionados a uma certa pessoa colados pelas paredes.
A saída do rapaz que andava a roubar foi catapultada por um email que eu escrevi à agência que nos aluga os quartos. Devia ser ela a contactá-los, visto que a situação que relatei foi uma discussão entre a M. e o rapaz às tantas da madrugada. Noutra ocasião, em que chegava a casa exausta, vinda do emprego, fui eu que, com um simples email com uma fotografia de um lava-louças entupido e imundo e o dizer: "todos os dias é esta a recepção ao chegar a casa" que tornei a situação clara e objectiva para a agência.
Costumava pensar que pessoas como ela fazem falta. E que podia aprender com ela. E posso. Aprendo a valorizar-me mais. A minha metodologia - abordar as pessoas quando sinto necessidade evitando o uso de um tom moralista ou irritação na voz, tem-se mostrado eficaz. Mesmo que não fosse, é a minha maneira de ser. Quem é ela para me dizer que não presta? Que a maneira de ser dela - com constantes explosões e provocações é a única correcta? Se mostrares respeito, geralmente, com pequenas excepções, recebes-o de volta. Agora se bates na porta de alguém, começas a dar ordens, a dizer à outra pessoa tudo o que ela faz de errado e como tem de fazer para fazer bem... cai mal. É uma forma implicante de se estar.
Quem sempre se queixou dos outros a mim foi ela. Eu nunca a abordei para lhe pedir que desse um "recado" a outra pessoa a morar na casa. Eu cuido de dar os meus próprios recados. Disse-me que não queria ser ela a "má", aquela que tem sempre de fazer o "papel de má". Quer transferir esse conceito para mim - querem ver? Acha que todos somos passivos e tem de ser sempre ela a colocar ordem na casa. Sofre um pouco de soberba.
Durante quatro ou cinco meses ela nada soube - pela minha boca, da situação entre mim e o Rapaz Nº1. Mas estava sempre a mandar-me os "recados" dele. Ou a expressar "opiniões" generalistas que "calhavam" encaixar-se numa situação específica.
Desci à cozinha passavam 15m da meia-noite, esfomeada e a desejar poder dar as minhas garfadas em silêncio. Tive de ouvir a sua ladaínha repetitiva. Quer que seja eu a dizer ao rapaz nº3 que incomoda quando o cheiro do fumo se sente no interior da casa. O que ela deixa convenientemente ficar de fora, é que a primeira pessoa a ter este comportamento foi ela. Até o rapaz nº1, que fuma lá fora (e muitas vezes dentro do quarto) consegue fumar no exterior sem deixar o fumo entrar na casa. Porque fecha a porta da cozinha. A M. que também fuma mas se acha "diferente" dos restantes - vê-me na cozinha a usufruir da minha refeição, e sem cerimónias, abre a porta que dá para a rua, põe os pés lá fora e começa a fumar deixando a porta aberta o que, como é obvio, faz com que fumo do cigarro entre pela cozinha adentro e invada a casa, inclusive o piso superior.
Quem é ela para passar um certificado de comportamento incorrecto ao outros? Não consigo lembrar de uma única incorreção de terceiros que ela não tenha exibido primeiro. Ela leva o Óscar. Que nem a Meryl Streep, a M. é indubitavelmente a melhor em todas as categorias.
Estava quase a terminar a minha refeição e ela não me deixava comer sossegada. Fui salva pela chegada do rapaz nº2 - que certamente também apareceu no intuito de interromper a conversa. Ela repetiu o seu intuito para os ouvidos dele ouvirem e foi embora. Vou finalmente poder comer em sossego - disse entre dentes. Depois recebi uma mensagem para ir trabalhar e lá fui, toda feliz.
Um texto muito grande para os meus olhos. Peço desculpa. Deixo um abraço e votos de boa saúde.
ResponderEliminarNão twm de se desculpar, Elvira. É de facto longo. E eu a pensar que este tinha saido curto! Ahah.
EliminarA Catarina e o namorado já estão à procura de novo apartamento porque a Mariana vai mesmo em Setembro.
ResponderEliminarAs duas a estudar em Londres.
Muitas libras!
Os estudos superiores são Caríssimos aqui, Pedro. O melhor que tem a fazer é comprar uma casa (na qualidade de estudantes sem rendimentos e difícil) e alugar um quarto a uma terceira pessoa. Mas isto se ficaream uns bons anos por Londres. Ao menos a qualidade do ensino tem valido a PENA? Que lhe diz sua filha?
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