Um cientista australiano solicitou o direito à morte assistida.
Com 104 anos, David Goodall que se manteve extremamente activo durante a sua vida, diz que lamenta muito ter chegado até a sua idade.
Quando me dizem que queriam viver até os 100 anos, respondo sempre "Eu não!".
Espantados, os outros dizem-me que querem viver muito tempo e, se pudessem, viviam para sempre. Ao que lhes respondo: "Se pudesse chegar até lá como estou agora, tudo bem mas como não é isso que vai acontecer....80, 70 é o suficiente.".
Sempre tive na ideia que, naturalmente, se morre lá pelos 80. E não me desagrada - nesta altura da minha vida e até este instante- essa eventualidade. Mesmo mais cedo, não me desagrada. Agora o que irei sentir quando lá chegar, será a realidade que, presentemente, só posso intuir. A morte não me assusta o que me entristece é o sofrimento em vida. A solidão, a doença prolongada, a falta de mobilidade, a dependência de terceiros até para as necessidades básicas. Essa condição natural de quase todo o envelhecimento que proguide até a total degradação física e psicológica. Não quero que o destino me reserve uma existência onde «morro» viva.
E viver até os 100 anos ou mais será, certamente, estar sujeito/a a tal realidade.
A luz de David Goodall está calendarizada para se apagar no dia 10, em Basileia, na Suiça, onde a morte assistida é legal. Acho que uma pessoa lúcida e consciente tem o direito de decidir isso. Respeito a sua decisão.
Nunca ouvi falar desse cientista mas acho que quem decide a sua morte é porque não é feliz. Ele tem 104 anos, perdeu a mobilidade que tinha, não tem emprego e já não pode conduzir. Para ele, isso é estar morto em vida. Não digo que concordo com a sua decisão mas respeito porque nota-se que ele ainda tem lucidez suficiente para tomar decisões.
ResponderEliminarÉ um ato corajoso saber quando vamos morrer. Eu não seria capaz de tal coisa. Não é o morrer que me assusta, é o não existir. Como é não estar mais aqui? Esse pensamento assusta-me terrivelmente!
Eu não penso ou sinto que deixo de existir. Existirei sempre, mesmo noutro estado. Quer seja o físico ou o espiritual. Tal como a água, que é líquida, sólida e vapor. Não a vês quando é gasosa, mas EXISTE.
EliminarO que termina é a vida, o físico, não a existência. Será uma transição parecida ao adormecer. Não estar mais aqui não me assusta nada - por agora.
Sendo uma espectadora privilegiada do sofrimento dos meus pais, só posso pensar do mesmo jeito. Mas há gente que mesmo em grande sofrimento não quer morrer. O meu pai que foi sempre um homem saudável e no último ano de vida se viu privado da sua mobilidade, e com dores intensas, pediu-me várias vezes para lhe alcançar o cesto com os medicamentos dele e ir dar uma volta durante umas horas. Depois já no hospital, durante a noite retirou o cateter da morfina e o soro. Quando a enfermeira na ronda pelos quartos se deu conta ele pediu-lhe por aqueles que mais amava que o deixasse morrer. É claro que ela voltou a por-lhe os medicamentos e chamou o médico. Viria a morrer 5 dias depois, mas a enfermeira disse-me que ele ainda poderia viver uns tempos, simplesmente tinha desistido de viver.
ResponderEliminarMinha mãe que estava em sofrimento profundo, estava sempre preocupada que não lhe trocassem algum medicamento pois não queria morrer.
Abraço e bom fds.
A resposta é simples, Elvira.
EliminarA sua mãe viveu a vida toda a querer sobreviver a mazelas que podiam tê-la levado. Ela sempre desejou sobreviver a mais uma tormenta. Para o final, mesmo a sofrer muito, o hábito não mudou.
Admiro quem gosta tanto de viver. Mas não me acho igual - embora por essa experiência não tenha passado.
O seu pai, pelo contrário, foi sempre saudável, capaz, independente. Subitamente tudo isso lhe é tirado e a sua realidade muda para algo que não lhe agrada. Não passou a vida inteira a sobreviver a doenças graves, pelo que não terá desenvolvido essa vontade de viver a todo o custo, por mais que o corpo lhe doesse.
Acho que está aí a explicação.
A minha avó sempre foi uma pessoa com problemas de saúde. Ora era uma coisa, ora era outra, mas diariamente algo a atormentava. Habituou-se que viver era sofrer sempre com algo. O que ela nunca perdeu foi a vontade de viver. Nem mesmo após ter enviuvado, nem mesmo depois do Alzheimer gradualmente lhe remover capacidades cognitivas. A sua força e vontade de viver, o seu espírito, trespassava pela doença, a sua garra. Ela queria viver a todo o custo. Muito a admiro por isso.
Já meu avô, mais saudável e sem aquelas mazelas que magoam o dia inteiro mas tem de se viver com elas, tinha os seus problemas de saúde, mas que o atormentavam de vez em vez. Ficava com uma vontade imediata de ficar bom, de ir ao médico. Já minha avó por vezes sabia que não adiantava, tinha de aguentar.
Sofrimento contínuo não é muito algo que um homem conheça, é mais uma condição da natureza feminina - digo eu.
Mas ele, a certa altura, sentiu-se muito só e desapontado. Reconheci-lhe a vontade de deixar de viver. Ouvi-o dizer que estava "cansado" de tudo e sei que, no contexto, interpretei bem o significado daquele desabafo. Logo a seguir desfez-se de coisas que amava, deixou de dar importância e de ligar. Foi uma fase, pois procurei que soubesse que era respeitado (por vezes desautorizam os idosos e estes interpretam, justamente, que lhe estao a passar um atestado de óbito precoce). Agarrou-se às suas responsabilidades novamente, mas com uma luz mais ténue. Intimamente, sei que não o assustava a transição, mas o acto de morrer, que todos desconhecemos, isso o assustava. Não o estar morto, mas o morrer.
Quando faleceu, a caminho do hospital, era suposto eu estar com ele, porque eu sentia-me irrequieta e só pensava nele. Sei que era alguém a "soprar" no meu coração para o contactar. Era suposto ele falecer nos meus braços. Mas ao menos não faleceu sem nenhum rosto conhecido por perto. Acho que isso o assustava mais que o morrer em si.
Forte abraço Elvira, e muita saúde!!