sábado, 17 de julho de 2021

Uma estrela de outros tempos cintila mais brilhante

 
Joan Collins é um dos nomes de artistas vivos, na cada vez mais reduzida lista de artistas da época de Glamour de Hollywood. Nos anos 50 ela já estava casada e a fazer filmes. 

Deixo aqui uma entrevista que encontrei no youtube. Simpatizo com pessoas que dizem as coisas desta maneira. Não escondem. Não andam com rodeios. Não contam tudo, não procuram chocar, nem receber admiração. Além de actriz, ela e a irmã são autoras de livros. Joan é capaz de ser a mulher que mais biografias lançou - sendo a primeira delas feita em 1978. Não é melhor assim? Conhecer a vida da pessoa pela própria ao invés de andar a especular na boca dos outros? Já li duas obras das duas mas nunca fui ler as biografias. Uma chance única de ler sobre alguém que está vivo. Deixo uma tradução para os que não conseguirem colocar as legendas.


Contexto: O escandalo de Walstein, o produtor de hollywood que assediou sexualmente mulheres ao longo de toda a sua longa carreira originou o movimento #Metoo e, nada mais natural, que o mundo perguntar "há quanto tempo isto acontece?". Para quem se lembra, já Marylin Monroe mencionava o mesmo. Há quanto tempo? Desde que o mundo é mundo e a mulher a parte mais fraca. 

Porque é importante falar destes temas abertamente? Porque se não o fizermos, eles - os criminosos, vão continuar a agir seguros de que ninguém lhes vai parar. Porque a mulher só começa a ser vista como igual quando for tratada com respeito e igualdade. Fala-se da homossexualidade com total liberdade mas chegamos à eterna descriminação de género e a mulher, em tantos aspectos, continua a não ser levada a sério e a sofrer escrutínio quando denuncia um mau comportamento de um homem. 


Tradução:

"Acho que é algo que tem vindo a acontecer pelo menos desde que eu comecei, uma jovem actriz de 16, 17 anos. Aliás, uma das razões pela qual o meu pai, que é agente teatral, não queria que eu fosse actriz, foi porque ele me avisou sobre "homens maus". Não sabia exatamente o que ele queria dizer com isso porque, sabe, como uma jovem de 16, 17 anos a começar a fazer filmes, eu tinha a inocência equivalente a uma criança de 10 anos hoje. Nós não sabiamos nada sobre nada. Certamente nada sobre a palavra começada por "s".  Quando fiz os meus primeiros filmes, fui a uma audição só para representar uma empregada doméstica que tinha apenas uma fala no filme. O diretor queria que eu puxasse a minha camisa para baixo, para que pudesse ver o decote e pediu para levantar a saia, para ver as minhas pernas. Eu fiz, porque não era mostrar muito. Achei aquilo um pouco estranho mas depois acabamos por esquecer. Nesta ocasião eu também estava a trabalhar como modelo fotográfico e os fotógrafos nem pensavam duas vezes sobre tocar-te aqui (coloca a mão no seio), beliscar-te o rabo, dar-te uma chapadinha no rabo, chamarem-te querida, docinho, bonitinha, amorzinho, qualquer coisa nesse género. Tratarem-te como uma caixa de chocolates.

- Como foi em Hollywood? 

-Ah, Hollywood. Bom, a primeira vez que passei por esta experiência foi com duas super, mega muito conhecidas estrelas. Foi numa festa. Era nova na cidade, tinha 21 anos mas era ainda bastante inocente. Estava a usar um top com ombros a descoberto e estes dois homens - eram tão famosos, mas não vos posso dizer quem eram porque o vosso advogado disse-me para não mencionar nomes - e eu, para meter conversa, disse: "Não gosto desta música". E um deles respondeu: "E eu não gosto disto" e ao dizê-lo agarra-me pelo top que era elástico e puxa-o. O outro ficou a rir. Senti-me humilhada. E fui embora. 

-"Chegou a falar com a Marylin Monroe a respeito disso?"

- Sim, pouco tempo depois conheci a Marylin numa festa na casa do Jean Kelly. Eu estava a fazer uma personagem no "A rapariga no balouço de veludo vermelho" e ela disse-me que coagitaram-na para interpretar a personagem mas foi considerada demasiado velha - essa coisa das idades - e então ela disse-me: "Querida, presta atenção aos lobos em Hollywood". Eu respondi que fiz filmes em inglaterra por três anos e sabia lidar com "lobos". Ela disse: "Não os chefões poderosos. Se eles não receberem o que querem tiram-te o contrato. Já o fizeram a muitas raparigas".

-"Afectou a tua carreira porque perdeste papéis. E Cleópatra foi um deles".

-" Esse foi o principal. Fiz vários testes. E ambos os  chefes do estúdio, que era um homem muito velho, com idade para ser meu avô, grego, ele era o CEO de toda a 20 Century Fox (empresa de cinema). Ele era o CEO e o chefe do estúdio era outro homem. Ambos andavam atrás de mim, (assédio) "a abanar a cereja" - que era o papel de Cleópatra. Eu fiz cerca de quatro testes para o papel. Numa festa estava a dançar com o cabeçilha do estúdio - que era um homem atraente na casa dos 50 mas eu era uma jovem de 24. Ele disse-me: "gostava de te colocar num pequeno apartamento e ir visitar-te duas a três vezes por semana. Garanto-te que terás primeira escolha sobre todos os guiões da 20 Century Fox". Sou um homem atraente.

- Mas é casado! - respondi.

A certa altura disse-lhe: Estou aqui com o meu agente. Vamos perguntar-lhe o que ele acha desse acordo. E afastei-me. Não ganhei o papel. Não sei se por esse motivo, se o estúdio preferiu ir com um nome mais famoso. 

"- Deve ser chocante, saber que uma actriz conseguiu o papel por fazer essas coisas"

- Fiquei um pouco chocada quando ouvi falar sobre a Marylin. Aparentemente a Marylin foi extremamente abusada por homens. E fez tantas coisas que não queria ter feito para conseguir papéis. A maioria destes homens eram gordos, velhos, feios, hediondos. Quando comecei, a meio dos anos 50, estes homens andavam naquele negócio desde que eram jovens de 20 anos. Eram todos velhos por aquela altura. 

-E as pessoas à volta devem ter sido complacentes. Contas-te uma história de ir ao encontro de um produtor e a secretária disse-te: "Ele está ali" e apontou para o banheiro. Ele estava na banheira. Ela devia saber que ele estava a tomar banho na banheira quanto te direccionou para lá ires.

-Sim, claro, Sim. 

-"Uma mulher enviou-te para ele na banheira"

-"A primeira coisa que ele disse foi: "Entra". "Não posso, não posso, tenho um encontro" "Com quem?" "Com o meu namorado, Worren Batty". "Quem é esse?" Eu respondi: "ele é um actor novo". Ele disse: "Porquê te dares ao incómodo de andar com um ator desconhecido? Eu sou mais importante. Vá, entra na banheira. Vamos falar sobre a personagem. Queres interpretar este papel?"

Era um papel excelente. Tinha sido interpretado pela Betty Davis. "Of Human Bondage" eu sabia que ia ser perfeita no papel - porque era inglesa, mas eu disse-lhe que não ia entrar na banheira, que tinha de ir embora. Depois ele olhou-me e perguntou: "Que idade tens"? "vinte e cinco". "Vinte e cin-co. Neste meio isso já não é ser jovem". E foi aí que compreendi que também existia o factor IDADE em Hollywood. Vinte e cinco não era jovem e vinte e sete era a idade em que se desinteressavam e já não atribuiam papéis. 

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