sexta-feira, 28 de junho de 2019

Trabalhos (não empregos)


Vou começar num emprego novo. Não é nada de especial, vai durar apenas 2 meses. Depois disso... tudo volta a repetir-se. 

O que me incomodou foi a quantidade de chamadas que recebi hoje da agência para saber se estaria disponível para trabalhar em caso de emergências. Disse que sim. Dez minutos depois voltam a ligar-me para fazer a mesma pergunta. Mais dez minutos, outra chamada, novamente a mesma pergunta... Já me estava a incomodar.

Vai ser trabalho de escravo. E a persistência da chamada para me indicarem à empresa como alguém que pode fazer horas extras ou trabalho non-stop só veio confirmar a suspeita.

O que também incomoda é a forma descartável como o ser humano é tratado. Agora é verão, precisam de muito pessoal, o trabalho é árduo, duro e difícil. Assim que o verão termina, acaba o emprego. Toda a dedicação - horas extraordinárias, esforço pessoal para acomodar as necessidades da empresa, terão valido nada. És "pago" por elas, mal certamente, mas isso basta às entidades para acharem que nada devem a ninguém. 



Foi assim que terminou a escravatura, sabiam?
Não porque um bem maior se ergueu nas consciências dos capitalistas. Mas porque estes perceberam que lhes ficava mais barato mão de obra paga do que escrava. Pode não soar assim porque "escrava" é de graça e paga é paga. Escrava não é livre e paga é. Mas apareceram uns espertinhos que explicaram até às cabeças mais casmurras e com simples matemática, que o lucro estava em pagar para alguém trabalhar. O escravo, principalmente depois da proibição do seu comércio, já não podia ser "renovado". Não podia ser vendido. Ficaria velho, dá despesas para alimentar, para cuidar da saúde, para vestir - ainda que mal. Mas nao tão mal que fosse desumano. E se morresse por algum motivo, era menos um a trabalhar que dificilmente seria substituido. O contratado, seria pago. E livre para partir. Se não fosse estar "preso" pelas dívidas acumuladas. Sim, porque este ia para fazendas remotas, teria de se alojar numa das barracas enjeitadas pelo dono das terras e pagar com aquilo que recebe, renda ao patrão. As roupas? Tinha de as comprar. Um homem tinha de alimentar a sua família sozinho. Esposa e não sei quantos filhos... Tinha de comprar os alimentos na loja do... patrão. Mal ganhava para o seu sustento e para pagar as dívidas... ao patrão. Era livre para partir, mas não tinha como pagar as dívidas e dificilmente arranjava outro trabalho. E assim o capitalismo se viu livre do estigma de "dono de escravo" e ensinou ao mundo como disfarçar o abuso e a exploração de mão-de-obra sem lhe retirar a liberdade física mas impondo condições e mais condições que tornariam infernal a vida de quem quisesse partir. 


Nasceu assim a moderna técnica de empregabilidade. A época de "colheita" dá-se agora no verão. A colheita é o turismo, as viagens de pessoas para destinos paradisíacos. E as ofertas são o produto. É preciso mão-de-obra para por tudo a trabalhar depressa e bem. Paga-se pouco, pede-se muito e depois manda-se embora.

O que também acontece são o aumento de ofertas de trabalho em tempo parcial. Oferecem-se posições com 20, 25, 32 horas de trabalho semanal. Isso não dá para uma pessoa sustentar-se. Mas como é só para tapar aqueles "buracos" de maior afluência, as pessoas são que nem barro: usadas para esse fim, somente chamadas para trabalhar quando o "cinto aperta".

No meu corrente emprego acontece isso. Recentemente os afectivos fizeram greve por não lhes darem horas extraordinárias. Então reduziram as horas que nós, temporários, vamos trabalhar para pagar a preço de ouro horas extraordinárias aos gananciosos funcionários. Têm direito a elas, reivindicaram-nas e assim os bolsos vão mais cheios ao final do mês. (Pagam muito bem ali aos funcionários da casa, e as horas extra valem mais do que o meu dia de trabalho). Mas com isto, uns continuam a servir só para serem explorados. Uns ganham muito pouco, para outros ganharem justo ou mais. 

E isso é injusto!!

2 comentários:

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