Quando era mais nova gostava de aproveitar os laços e os papéis dos embrulhos de Natal. Mas tinha de fazê-lo sem que ninguém percebesse (o que era difícil), porque diziam que aquilo era lixo e eu não devia guardar lixo. Era sempre recriminada e tratavam-me como se eu fizesse aquilo por ser sovina como o tio Patinhas, só para não gastar na compra de outros. Mas não era por isso. Eu gostava, como ainda gosto, de reutilizar os materiais. Eles desafiam-me, ficam ali a dizer que têm utilidade para outros fins e eu sei que têm razão... e quero descobrir quais!
Antigamente, mas não assim há tanto tempo quanto isso (apenas há uns dois anos), aproveitar o papel e os laços decorativos que vinham oferecidos noutros embrulhos era considerado de mau gosto. Era feio, pronto.
Como as coisas mudam! Agora, a chamada "crise" e os problemas ambientais anteriormente amplamente referidos mas nunca escutados, definitivamente ocuparam o seu lugar nas consciências de todas as pessoas (ou quase). Mesmo que não sejam ecológicas o suficiente, já têm essa noção incutida na sua mentalidade. E isso, meus caros, é o grande MILAGRE dos últimos dois anos: os defensores da preservação da natureza, que eram vistos como hippies meio alucinados que não se calavam com os direitos da mãe-terra, passaram a ter alguma razão...
Os meus embrulhos na adolescência eram feitos com tudo: papel de jornal, papel crepe, papel castanho, cartão, revistas, galhos, folhas de árvore, bolotas... tudo considerado de mau gosto. Lembro em particular de olhar para as embalagens de cartão das pizzas e decidir que tinham de ter utilidade. "Pelei-as", retirando-lhes a película de papel gordurosa e deixando apenas o canelado do cartão. Vireias do avesso, cortei-as, redimencionei-as e fiz caixas. Algumas pintei de dourado, coloquei glitters e "abracei" com fitas largas douradas e acobreadas, feitas com fios entrelaçados. Em alguns embrulhos coloquei uma folha de plátano totalmente seca e espalmada, para servir de cartão de identificação de boas-festas. Ideias... e folhas secas de plátano não faltam na rua nesta altura do ano!
O ano passado fiz um arranjo de mesa composto de folhas de plátano enroladas em forma de rosas (ideia que não foi minha, retirei de uma dica que alguém me deu), e enriqueci-o com outras folhas de diferentes tamanhos e tonalidades. Uma Oliveira em botão espantosamente encontrada tombada no meio do calcetado passeio forneceu-me os ramos com fruto que precisava para dar mais vista a tudo (agradeci-lhe pela oferenda inusitada) e a aplicação de ráfia vermelha no meio de tudo isto deu o toque final a um arranjo natural que ficou único e diferente. Ainda assim, quando desci à rua para apanhar as folhas, ou quando fiquei de volta dos ramos da Oliveira a tentar quebrá-los, quem passava achava estranho! Ainda havemos de avançar para o dia em que ninguém vai se importar porque já sabe para que servem!
Fiz muuuitos "embrulhos malucos", que era como os membros da família se referiram a esta forma de expressar a minha criatividade. Ontem passei a noite a alterar o aspecto de dois presentes que comprei para oferecer a duas crianças de idade inferior a 10 anos. O que lhes comprei era singelo no aspecto, mas muito divertido para crianças e decidi que, para elas, o certo era pintar e colocar uns apliques na base do presente, de forma a este ficar único e a transmitir a "energia" correcta.
Não sou a mente mais original e criativa do mundo mas sei que hei-de chegar ao último dia da minha vida com esta característica. Por muito que a tentassem extrair como se fosse um dente podre, pela pouca "água" com que foi regada e pelo pouco nutriente que recebeu para se desenvolver, ainda cá permanece como uma característica indissociável.
Agora, o que gostaria é que as pessoas pensassem melhor no "lixo" que o Natal produz e procurassem formas de o reduzir. O reaproveitamento do papel é uma delas. Embalagens grandes, como por exemplo grandes caixas com bonecos para crianças, podem voltar a embrulhar dois livros. Usar folhas de jornal para fazer os embrulhos ao invés de papel específico com uma bela estampa, o que antigamente era considerado de mau-tom, é agora aceite e visto como um gesto (ainda) original e consciente. Portanto, porque não aproveitar?
Boas-Festas a todos!!
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