segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Novo ano chinês: wooden snake em trafagal square

 Trafagal square encheu-se de pessoas para ver o espetáculo que a camara de Londres ou a London Chinatown Association organizou para celebrar o novo ano chinês.

Fui convidada por amigos para ir e lá fui. Mesmo a tempo de abrirem as cancelas e ver a multidão a invadir a praça e a correr para ocupar a escadaria situada diante do improvisado palco.

Também entrei. Assim que me posicionei as duas pessoas mais altas que vi entre a multidão meteram-se descaradamente á minha frente e fincaram pé que nem estátuas. Achei má educação. Haviam outros espaços, elas viram-me e ainda assim posicionaram-se mesmo coladas a mim tapando-me toda a visão. Tive de mudar de lugar, fazendo questão de me posicionar novamente de modo a não incomodar quem estivesse atrás. 

Em poucos minutos conclui que não gostava da nossa posição porque ficamos muito atrás das cabeças de uma enorme multidão e mesmo atrás de um corredor de movimentação de pessoas. É o mesmo que tentar me concentrar num ponto ao longe ou tentar ver um programa de TV mas à entrada do metropolitano: um horror.

 Estava a sentir a cabeça a ficar zonza devido ao constante movimento que meus olhos captavam vindo de todas as direções. Parece magoar a vista e causar dor de cabeça. 

O evento lá começou. Só que não. É que primeiro chamaram ao palco uma série de vips. Cada um fez um discurso que não acrescentava nada ao anterior. Alternados apenas pelos diálogos introducionais de dois apresentadores, que recorriam entre discursos, a adjectivações generalistas, exageradas e ocas de sentido: "obrigada sra. X, por esse discurso Inspirador/Fantástico/maravilhoso"

E a multidão já a vaiar.

 Uma hora depois ainda estavam nisso. A multidão vaiava e o palco parecia ignorar. Quando parecia que iam acabar, voltavam a chamar outro VIP ou liam a carta de um VIP, tal como leram os desejos escritos de Sua Magestade.

Além disso, estar ali de pé quando já fico várias horas de pé no trabalho não fazia sentido para mim. Minhas pernas sentem sensações esquisitas e incomodativas. 

Ficar ali de pé para nada ver, só para ouvir longos e chatos discursos de cada membro envolvido na organização do evento não valia a pena. Ficou claro que o melhor a fazer seria  abandonar o evento e começar o quanto antes o passeio por Londres. Porque o melhor do dia estava a ser o próprio dia. Um dia com sol!

Sol, céu azul, frio mas um dia abençoado por luz. Em Inglaterra isso não dura muito e quase nunca para além do meio dia. E era quase 1 da tarde. 

Os organizadores do evento não eram lá muito inteligentes para achar que podiam manter uma multidão interessada em mais de uma hora de discursos que ultrapassam as horas de almoço, sem sequer mostrar um pouco de entretenimento.

Temi que o frio predominasse, que o sol ficasse encoberto e o passeio que íamos dar pela cidade depois fosse menos agradável.

Mas nada disse aos restantes e deixei que fosse o grupo a decidir quando partir. Para quebrar o tédio avisei que ia ao WC. Esses foram os melhores minutos de tudo aquilo. Sai quando os apresentadores do evento estavam há uns 20 minutos a dizer que iam acordar o dragão 🐲.

Dirigi-me aos lavabos da trafagal square e percebi que existia muita mais espaço livre por ali, mais conforto, muitas pessoas sentadas. Por mim teria procurado melhor posição pois não via nada sem ser cabeças e corpos sempre em movimento. Mas não quis dizer nada ao grupo. Afinal, foi a primeira vez que saí com estas pessoas, elas é que tinham experiência.

Meti-me numa cabine de WC, aliviei-me, abri a mala para beber um gole de água mas acabei por tirar um iogurte. Enchi o estômago de sabor a frutos silvestres... Delícia.

Nem me apetecia voltar. Estava com vontade de explorar a cidade, antes que escurecesse ou o sol perdesse a força do seu calor. Sem muita pressa, lá sai do lavabo, lavei as mãos e voltei a juntar-se ao grupo. O meu consolo estava em achar que, pelo tempo demorado, o tal do dragão já tinha sido acordado. 

Cheguei ao sítio e os colegas tinham avançado para a frente do corredor de tráfego, o que por si me deixou bem aliviada. Quando percebi que ainda não tinham acordado o dragão e iam chamar mais alguém ao palco para discursar fiz o primeiro comentário a respeito: "O quê? Ainda não acordaram o dragão? Quando fui ao WC ja o estavam a acordar". 

- "É por isso que as pessoas acabaram de vaiar. Não ouviste?"

Pouco depois escutou-se um forte e sonoro som de desagrado vindo de parte da multidão: um grande "Vooooo".

Pensava nos ensinamentos daquela situação. Ali estava espelhada o que é, na realidade, a verdadeira e mais forte faceta da China: a burocracia. O mascarar da realidade. Uma multidão descontente e aborrecida e as pessoas no palco a pedir para que gritassem que estavam a gostar. 

Os meios de comunicação que forem informar o que ocorreu no evento vão falar bem de tudo quando na realidade foi tudo muito poucochinho e muito secante.

Fez-me perceber que a China é um país comunista e o que se divulga não é a verdade. 

Percebi que culturalmente dão muita importância a rituais burocráticos de faz-de-conta, mais do que são capazes de honrar o muito anunciado entretenimento que foi o que levou as pessoas até ali. 

Finalmente, com o dragão já acordado e com uns 50 envelopes vermelhos distribuídos aos vips, lá veio o espetáculo de acrobacia, com os artistas enveredando um fato de dragão e a pular de poste em poste.

As pessoas começaram a abandonar o recinto por essa altura. Era quase uma da tarde.

Esperamos para ver se existia outro ato artístico mas como foram para INTERVALO.... Nós e muitos outros fomos embora.

Achei aquilo mal organizado porque faltou a todos a percepção do que é entretenimento. Aquilo esteve mais para canal de parlamento que outra coisa. Só que pior, porque ao menos no parlamento ainda se trocam uns insultos e a coisa aquece...

Lamentei pelo povo na China, que tinha aquilo como o pão de todo o dia. Sem se perceber é assim que se cansam as pessoas e as fazem obedecer e ignorar outras formas de viver a vida.

Fomos então passear para China Town. Cheia de gente, também com vários dragões ao som de tambores. Nem seria preciso ficar na praça trafagal, bastaria andar pelo bairro.

Enquanto por todo lado se escutava o som de estalos com pólvora a rebentar no chão, o que me deu uma saudade de memória de infância, dei com uma faixa com o nome FALUN GONG e me interessei de imediato. Disse aos meus colegas: olhem, aquilo é importante. Vou lá espreitar

Eles não pararam de caminhar entre a multidão e se afastavam de mim, então aproximei-me muito rapidamente e estiquei a mão. Outra foi estendida de volta e me entregou um panfleto, com um simples "thank you". 

Não quiseram discursar nada, falar nada, explicar nada. Estava uma senhora idosa em posição de pernas e braços abertos, imóvel como uma estátua diante da faixa que juntava as palavras FALUN GONG +ORGANS + SIGNATURE.

Apressei-me para não perder de vista o meu grupo e olhava o panfleto, procurando perceber se podia dar a minha assinatura uma vez em casa. Senti incómodo. 

Aproximei-me do grupo e disse-lhes que aquilo era importante. Depois, olhando de volta, percebi que podia deixar a minha assinatura ali mesmo. Pelo que voltei a avisar o grupo que ia me afastar e assinei uma folha de papel que continha, até o momento, poucos nomes.  

Não me pediram nada. Nem dinheiro, nada. 

Escutei um outro "muito obrigado" e voltei ao grupo, dizendo que eles não pediam nada a não ser uma assinatura não custava nada. Eles deviam assinar também porque era sobre retirar órgãos de pessoas com estas ainda vivas. 

Mas ninguém pareceu entender. Depois, passeando e vendo a alegria das crianças, lembrei-me das saudades que tive e que nunca mais vi - por ser proibido, os tais "estalinhos" de carnaval - pois era assim que se chamavam no meu tempo. Vinham embrulhados em papel fino e colorido e era tão divertido atira-los ao chão para ver a faísca e ouvir o estalo.

Enquanto o grupo olhava para mais um tipo aos pulos vergando um fato de dragao, avisei que ia até uma bancada improvisada para ver o que estavam a vender como souvenirs. O mais barato e mais interessante eram mesmo os estalidos. Acho que já ia com essa ideia em mente, ainda que não o soubesse.

Comprei os estalidos com alegria de nostalgia. Infelizmente não mais em papéis coloridos, nem vendidos á unidade na papelaria como em saudosos dias de carnaval... Mas ainda assim, algo que não existe mais em Portugal e que agora posso recordar.

O pó dos mesmos não é escuro como me recordo ser os de antigamente. É branco. Embora escutasse os estalidos por toda a parte não detetei de onde vinham nem vi clarões de súbita faisca. Talvez hoje sejam diferentes mas pronto. Pela nostalgia... Comprei uma caixinha com 50 unidades.

Depois fomos almoçar e caminhar por Londres, só a ver a paisagem.

De toda esta experiência o que concluo ter sido a de maior valor e importância foi mesmo aquela petição de recolhas de assinaturas contra a prática de genocídio e recolha de órgãos em pessoas vivas, tendo como alvos preferenciais as pessoas pacíficas e inocentes que praticam a meditação FALUN GONG. Mas também qualquer pessoa que o estado da China considere traidor pode ser vítima desta atrocidade de fazer dinheiro com órgãos removidos de pessoas saudáveis e vivas.(E não pensem que colocam anestesia).

O lado da China que se varre debaixo do tapete - assim como tanta outra atrocidade.

O mundo tem de começar a ver o real e não procurar só o entretenimento. Dragões coloridos aos pulos não define tudo o que vem da China.

Agora é na China. Amanhã...

Se é crime contra a vida humana é contra todos nós e a todos diz respeito.


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